segunda-feira, 4 jun 2012
Estamos caminhando para uma sociedade de perdedores, de
maricas, de frangos, em suma, de pequenos indivíduos medíocres. Cento e doze anos após a morte de Nietzsche, o
Brasil embarca numa cruzada moralizante de rebanho. É espantoso ver como andamos rapidamente para
o matadouro da civilização. Caminhamos
para a nossa morte, em
silêncio. Meu tom
apocalíptico pode parecer exagero, mas é necessário para demonstrar o quanto
determinadas atitudes estão levando a humanidade ao seu crepúsculo. A nova lei do bullying é um exemplo disto.
Sob a alcunha de "intimidação vexatória" o Brasil irá
criminalizar o bullying. Aquele colega
de sala de aula chato que todos nós temos ou tivemos, apaixonado por colocar
apelidos e que, devido ao fato de ter menos vergonha ou ser mais efusivo,
sempre ultrapassa um pouco os "limites", será criminalizado pelo simples fato
de ser chato. Estamos decretando o fim
do humor, da piada, da risada e da diversão que é capaz de mudar a nossa
rotina.
Obviamente que a lei não é tão simplista quanto o exemplo do
colega praticante do bullying para com os gordos, portadores de óculos, fanhos
etc. A lei proposta é clara em dizer que
o crime é intimidar, constranger, ameaçar, assediar sexualmente, ofender,
castigar, agredir ou segregar criança ou adolescente. A punição será de um a quatro anos, em caso de
condenação. Aqui é preciso dar uma
pausa, respirar e demonstrar a estupidez desta proposta de lei.
A particularização das leis mais atrapalha do que auxilia. Uma proposta de simplificar o que seria de
fato um crime é defini-lo como coação para com a vida e a propriedade de
terceiros. Neste sentido, agressões
físicas, assassinatos, roubos e furtos são crimes fáceis de identificar, pois a
coação para com a vida e propriedade alheia é evidente. Como podemos identificar o crime de
intimidação vexatória?
Intimidar é obviamente uma agressão para com a integridade
da pessoa, é levá-la pela força a agir ou deixar de agir de determinada forma. O mesmo ocorre com a ameaça e a agressão. É fácil identificar que estes três pontos
possuem realmente um viés de coação para com a pessoa. Não é preciso esperar o disparo da arma para
agir, a arma em punho e a clara intenção de atirar, isto é, a ameaça, é
passível de reação perante o agressor. Entendo
que os critérios que constituem a diferença entre uma mera ameaça trivial de
uma ameaça real podem ser nebulosos, por isso o uso do exemplo da arma. O que não faz sentido é que já existem leis
que criminalizam a agressão, a ameaça e a intimidação, não fazendo sentido mais
particularizações.
Não é preciso falar sobre o assédio sexual, que também já é
crime e não precisava constar na lista da intimidação vexatória.
Os problemas começam com a criminalização do
constrangimento. Como mensuramos o
constrangimento? Tudo o que constrange
individualmente uma criança e adolescente deverá ser crime? Numa sociedade de adultos donos de si mesmo e
não meros servos de vontades alheias faz-se tudo aquilo que não agrida
terceiros. Apenas seres pequenos visam
coibir, pela força da lei, que pessoas livres exerçam sua liberdade. O não constrangimento está muito mais
relacionado à sensibilidade humana em não constranger do que em privação de
determinada atitude em prol de um conceito subjetivo.
Paralelo ao "crime" de constrangimento está o "crime" da
ofensa. Pessoas fracas se sentem
ofendidas. Esta lei me ofende por ser
estúpida, mas não fico pedindo a prisão dos anencéfalos da comissão de justiça
do senado por estar ofendido com tamanha burrice. Ofensas são combatidas ou são ignoradas num
processo de abstração psicológica. Prender
por ofensa é coisa digna de pessoas mentalmente infantilizadas, incapazes de
superar um xingamento. O mundo adulto é
repleto de ofensas, calúnias e difamações. Por este motivo ofendo todos os patéticos
asseclas da criminalização destes atos.
Outro ponto complexo é a definição de castigo. Como criminalizar um castigo? Castigar uma criança amarrando-a num poste,
espancando-a com chicote ou cortando seu corpo são todos castigos de agressão
física, obviamente atitudes condenáveis. Fico imaginando quantos processos idiotas de
adolescentes chatos e pentelhos irão surgir contra as "punições" recebidas de
seus pais. Os políticos desocupados
(desculpem a redundância) ficam criando estes textos inúteis apenas para daqui
algum tempo posarem de benfeitores de "leis da moda". É óbvio que entra em pauta a velha discussão
sobre a palmada. Estou convicto que há
maneiras mais eficazes de disciplinar um filho, como o uso de regras claras,
objetivas e construídas de maneira participativa, com punições restritivas e
diálogo acerca da ação e da punição. Entretanto,
criminalizar um pai que faz o uso da palmada (que é algo bem diferente do
agredir por agredir) é criminalizar a escolha disciplinar. Para os adeptos da
discussão sobre diversidade cultural, que defendem que índios possam matar
crianças defeituosas ou gêmeas, a palmada é uma construção cultural da tradição
judaico-cristã. Neste aspecto, por mais
idiota que seja usar a "varinha", não faz sentido criminalizar o castigo
perpetuado pelos pais para fins disciplinares.
Por último ficou a segregação. Eis outra palavra-coringa do modismo
intelectual brasileiro, seguindo a estrada aberta pelo multiculturalismo. Segregar é separar, excluir, não querer manter
contato. Agora, as crianças sem amigos
podem acusar os colegas de segregação. Evitamos
contato com diversos tipos de pessoas e por diversos motivos. Existem diversas pessoas que trabalham com
moradores de rua, com sua alimentação, saúde, moradia, reintegração. Porém, há quem tenha, pelo motivo mais idiota
que seja, certo nojo de estar perto de moradores de ruas. Ignorar crianças que moram nas ruas e
evitá-las é um tipo de segregação. Não
faz sentido criminalizar alguém que não deseja que certa pessoa participe de
seu convívio pessoal.
No fundo, o que esta proposta possui é a insanidade de
juntar várias propostas isoladas como a criminalização da palmada e da
separação de pessoas do seu convívio. Colocaram
itens diversos e foram aplaudidos por pedagogos por criminalizarem o bullying. Os "profissionais" da educação demonstram ser
incapazes de lidar com este fato escolar e ficaram felizes com a proposta de
lei porque a responsabilidade do bom andamento do processo de
ensino-aprendizagem se tornou uma questão jurídica. Não precisarão mais estudar e aprender a
enfrentar situações, pois bastará acionar a justiça para que o problema seja
resolvido. São os perdedores que se
alegram quando outros retiram um pouco de seu fardo.
Para completar a proposta, se o "criminoso" for menor de
idade não será preso, mas cumprirá uma pena sócio-educativa. Se a prática de bullying ocorre com maior
frequência entre crianças e adolescentes, a lei tem qual finalidade? Os professores já não tomam, ou pelo menos
deveriam tomar, medidas educativas para lidar com a questão do bullying? Se o debate acerca da intimidação vexatória
está presente nos ambientes escolares, com aprendizados sobre alteridade e
diversidade cultural, a pena proposta é mais do mesmo. Sendo assim, o alvo desta proposta de lei é
criminalizar adultos. Foca-se no
bullying, mas indiretamente se criminaliza a palmada, por exemplo. Punirá, na
verdade, os pais e os professores. O
efeito jurídico será a possibilidade de enquadrá-los em mais delitos.
Portanto, esta proteção das crianças e adolescentes tem como
efeito criar uma geração de incapacitados em lidar com aqueles que não o
aceitam. Serão mimados, não mais pelos
pais frouxos, mas pelo estado e por todo o poder coercitivo que este possui para
criminalizar e punir aqueles de quem os mimados não gostam. Em vez de ensinar a grandeza do gostar de si
e de aprender que no mundo há gente disposta a humilhar e diminuir terceiros e
que é preciso estar blindado para combater este tipo de gente, estamos
ensinando que ser perdedor e psicologicamente abalável é algo bom. O problema não está em aprender a lidar com os
chatos, mas o problema é a existência dos chatos, que merecem cadeia. Neste tipo de inversão lógica é que avançamos
para a ruína de nossa sociedade. Exaltamos
a incapacidade de enfrentar o mundo, quando deveríamos fazer exatamente o
oposto.