quarta-feira, 29 ago 2012
À medida que o jovem recém-formado de uma universidade
no Brasil procura por melhores salários iniciais e oportunidades em grandes e
médias empresas, que em sua maioria já tem seu corpo de colaboradores formados
por profissionais experientes, mais ele tem de buscar experiências prévias que
justifiquem ao empregador um salário inicial tão alto para alguém cujas
habilidades requisitadas ainda não foram desenvolvidas.
No período anterior à década de 1970, ainda existiam
poucas universidades, e o diploma de nível superior praticamente já assegurava
uma posição em uma boa empresa ou em algum cargo público. Porém, com o passar
do tempo, mais universidades foram criadas e uma experiência prévia foi se
tornando importante, sendo comum jovens trabalharem em bancos ao mesmo tempo em
que cursavam faculdade. Nessa época, a legislação de estágio não era tão
rígida, não garantia tantos direitos ao estagiário, sendo mais fácil este dar
início às suas atividades mesmo que por vezes não obtivesse a remuneração das
mais desejadas. Era isso, porém, que permitia a muitas pessoas pagar sua
faculdade ou mesmo se destacar no mercado de trabalho.
Chegada a década de 1990 e o novo milênio, o número de
faculdades ascendeu consideravelmente, como resposta à necessidade de
profissionais mais especializados geradas por um ambiente competitivo global e
devido à enorme procura criada em torno dos concursos públicos. Nessa mesma
época, por exemplo, a criação de cursos de Direito teve o maior crescimento da
história.
O fato é que hoje a legislação de estágio está ainda
mais amarrada, conferindo direitos típicos de um trabalhador regular de
carteira assinada, como direito a férias de 30 dias para cada 12 meses de
trabalho, bolsa-estágio e auxílio-transporte compulsórios em casos de estágio
não-obrigatório. Além disso, o empregador deve obedecer a uma relação numérica
mínima entre empregados e estagiários, isto é, para cada estagiário que ele
queira contratar, a empresa deverá possuir de 1 a 5 empregados de carteira
assinada para viabilizar a contratação; caso ele necessite de 2 estagiários,
deverá possuir o mínimo de 6 a 10 funcionários. Isso eleva os custos para o
empregador, o que acaba tornando a entrada do estagiário na empresa ainda mais
difícil. Não é a toa, então, que está se tornando comum que o processo seletivo
aplicado para candidatos à vaga de estágio e trainees seja exatamente o mesmo ao aplicado para candidatos a
cargos de maior responsabilidade e remuneração.
O mínimo para se ter condições de ser contratado por
uma boa empresa é ter experiência prévia. Mas como ter esta experiência sem
nunca antes ter participado de um programa de estágio ou ter trabalhado com
carteira assinada?
Há três opções: 1. Faculdade Cursada e Excelentes
Notas; 2. Realizar Intercâmbio; 3. Realizar Trabalho Voluntário.
A primeira opção foi por muito tempo um fator
decisivo, mas, dado que de maneira geral a atividade realizada por alguém
inexperiente e não especializado geralmente não pressupõe conhecimento fora do
comum, acabou assumindo um papel não muito relevante, ainda mais quando se
pensa na possibilidade de que alguém possa atender a todas três opções.
A segunda opção de realizar intercâmbio é cada vez
mais valorizada no momento em que se percebe que a capacidade interpessoal de
uma pessoa aumenta consideravelmente quando entra em contato com uma nova
cultura e um ambiente novo. Realizar intercâmbio confere flexibilidade, além de
proporcionar o aprendizado de uma nova língua.
A terceira opção é atualmente talvez a mais importante
das atividades que devem constar no currículo e merece uma melhor atenção.
Trabalhar voluntariamente se tornou a atividade mais valorizada por apresentar
oportunidades que um estágio curricular de forma alguma proporcionaria.
Trabalho voluntário virou sinônimo de trabalho com autonomia, de trabalho em
equipe e de oportunidades de liderança. Virou sinônimo de trabalho de cunho
social sem remuneração.
Será, porém, que um trabalho de cunho social sem
remuneração seja o único caminho para um aprendizado rápido, autonomia,
trabalho em equipe e oportunidade de liderança? Caso isso seja verdade, as
pessoas que não possuem uma condição familiar que sustente suas atividades
não-remuneradas teriam condições de ter essa oportunidade tão grande de
desenvolvimento?
Essas pessoas teriam que suprir necessidades mais
urgentes e aceitar um emprego que não lhes proporcionasse tanto aprendizado, e,
de maneira similar, não teriam condições de participar de programas de
intercâmbio. Aparentemente, a situação econômica de um indivíduo sempre irá
impor dificuldades e irá impossibilitar que este alcance um trabalho de grande
aprendizado.
Imagine agora, porém, uma empresa recém criada cujo
escritório tem dimensão bastante reduzida e cujo administrador Justino é um
autônomo que está precisando de no mínimo 4 graduandos ou não sem muita
experiência para auxiliá-lo no trabalho. Ele, porém, só tem condições de
empregar um deles com carteira assinada, devido ao custo que um simples
funcionário acarretará. E, por causa dessa limitação, terá o crescimento e
funcionamento da empresa prejudicados. Justino estaria disposto a pagar até 400
reais para cada um dos 4 funcionários, mas, em vez disso, devido aos vários encargos
sociais e trabalhistas e aos impostos que ele paga ao governo, um funcionário
ganhando o equivalente a um salário mínimo acaba custando, admitindo um total
de 102% de encargos, (R$622 + 1,02xR$622) R$1256, mais de R$1200 e cerca de
R$1600 que é o limite de Justino. Outra opção de Justino seria contratar 4
estagiários para diminuir o custo trabalhista, porém devido à legislação de
estágio isso não é possível, porque ele deveria ter no mínimo o total de 11
empregados regulamentares para tornar isso possível.
Quantos jovens, porém, que não possuem condições de
ingressar em um trabalho voluntário estariam dispostos a trabalhar
voluntariamente na empresa de Justino ganhando uma soma de R$400? Quantos
jovens estariam dispostos a trabalhar para Justino até mesmo de graça, sabendo
que teriam oportunidade de aprender rápido, ganhar grandes responsabilidades,
acompanhar o crescimento da empresa e com isso finalmente obter a remuneração
desejada e os cargos de liderança que aparentemente só eram possíveis em
iniciativas não-remuneradas como empresas júnior e trabalhos de cunho social?
Isso é algo que na situação atual não é permitido responder.
Feitas essas considerações sobre alguns dos itens
avaliados em um processo seletivo, caso o candidato esteja concorrendo para
vaga de estágio, ainda tem que passar pela aprovação de sua universidade,
devendo demonstrar que seus interesses pessoais compactuam com os interesses da
universidade. Isso quando a universidade não simplesmente arbitra o período da
faculdade em que são permitidas essas atividades. É possível, então, que mesmo
que o candidato passe em todas as etapas do processo seja impedido por sua
própria universidade de dar início às suas atividades.
Fica claro, então, que até um jovem com nível superior
completo tem que passar por uma bateria difícil de testes caso queira
oportunidades que lhe recompensem por seus mais de 20 anos de investimento em educação. Acaba
sendo normal, por força da alta concorrência e pela impossibilidade de firmar
contratos livremente, que um jovem recém-formado aceite empregos que não
correspondam às expectativas, ocupando cargos que seriam de esperar que fossem
ocupados por pessoas que só completaram o ensino médio. O efeito dominó é então
criado: algumas pessoas que concluiram o ensino médio ou têm cursos técnicos
ocupam as posições de quem concluiu somente o nível fundamental; e as de nível
fundamental ocupam os lugares de quem não tem escolaridade alguma.
Considerado isso, é fácil entender por que a taxa de
desemprego é tão alta entre os jovens, e por que são estes os principais
emergentes na chamada camada de baixa renda. Enquanto pessoas mais velhas vão
adquirindo experiência e aos poucos vão conseguindo ter uma remuneração melhor,
os jovens, principalmente aqueles que não tiveram oportunidade ou que se
desiludiram com a péssima qualidade de ensino e a monotonia da sala de aula,
sofrem com leis trabalhistas e taxas tributárias abusivas que os obrigam, mesmo
sem experiência ou pouquíssima escolaridade, a justificar um salário mínimo de
R$622, que como demonstrado acaba custando no total cerca de R$1.256 ao
empregador. Logo o jovem tem que justificar um custo de R$1.256, através de uma
produtividade que por vezes ainda não atingiu.
Quais são, então, as alternativas para conseguir
trabalhar que restam aos jovens mais desprivilegiados que abandonaram cedo os
estudos? Caso estes simplesmente não tenham desistido da vida honesta, pode-se
optar pelo trabalho informal, mas este é ilegal e infelizmente de acordo com a
lei estariam incorrendo em uma atividade desprovida de virtudes. A outra opção
seria trabalhar ainda quando criança sob a assistência ou supervisão dos pais,
porém essa opção está descartada, o trabalho infantil está impreterivelmente
condenado à proibição ao mesmo tempo em que profissões que não raro eram
transmitidas de pai pra filho, como a de carpinteiro e mestre-de-obras, vão se
tornando cada vez mais escassas. Existe ainda uma terceira opção bastante similar
a anterior, que seria um ensino conferido pelos próprios pais dentro do
ambiente domiciliar, porém esta também sofre de várias complicações legais que
podem levar a consequências nada desejáveis.
O cenário é desolador e parece relegar ao jovem de
baixa escolaridade duas opções: ir contra a lei de alguma das formas citadas ou
ficar desempregado. Fica, então, visivelmente compreensível a atual preocupação
que se é dada ao acesso à educação que indubitavelmente não é a mesma para
população de baixa renda. O que falta, porém, em meio a todo esse clamor
justificável à educação, é a parcimônia e clareza de enxergar que uma reforma
da infraestrutura das escolas públicas, melhoria de salários do corpo docente e
o aumento do nível de dificuldade das provas aplicadas nessas escolas não sejam
os únicos fatores a influenciar na qualidade do ensino e na escolha da criança
ou do jovem de continuar investindo seu tempo em educação. A questão da
educação é importantíssima, porém não deve ser vista como a medida suficiente
para resolver todos os problemas.
É preciso ver que existem, sim, medidas de curto prazo
eficientes a serem adotadas e duas delas, sem dúvida alguma, são a redução ou
extinção da carga tributária aplicada ao trabalhador/empregador e uma reforma
trabalhista que garanta maior flexibilidade na consecução de contratos,
extinguindo direitos/obrigações trabalhistas que desfavoreçam às partes
interessadas, como a lei do salário mínimo, por exemplo, que, como várias vezes
demonstrado ao longo desse artigo, desfavorece principalmente àqueles que
sofrem de uma condição econômica inferior, contribuindo ainda para desigualdade
de renda e impedindo a emergência e treinamento de uma mão-de-obra inexperiente
ao mercado de trabalho.