quinta-feira, 27 out 2016
Nota
do Editor
Este Instituto praticamente já esgotou seus assuntos
sobre a Suécia (ver aqui,
aqui, aqui, aqui, aqui e aqui). Portanto, nada
melhor do que compilar tudo o que foi dito em cinco itens sucintos e diretos.
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Quando o assunto é política econômica, a Suécia se destaca.
De um lado, esquerdistas de todo o mundo citam o
país nórdico como um exemplo de que um estado grande e assistencialista
funciona. E dado que várias fontes de dados (como o enorme banco
de dados do FMI) mostram que a Suécia é relativamente próspera ao mesmo
tempo em que possui uma pesada carga tributária, o argumento parece ser plausível.
De outro, liberais, embora críticos ao atual estado
de bem-estar sueco, dizem que o país primeiro enriqueceu por meio do livre
mercado, e depois, só depois, adotou um estado de bem-estar social abrangente. E,
após ter adotado este modelo, seu crescimento econômico estancou.
Esse ponto está em conflito direto com a visão da
esquerda, que frequentemente chega a afirmar que a Suécia é rica por causa de seu estado
assistencialista, e não apesar dele.
Tal afirmação não só é um atentado à lógica econômica
(a qual não combina com sentimentalismos), como também, para piorar, nunca foi
comprovada via fatos e evidências.
A seguir, cinco fatos a serem apresentados sobre a
Suécia.
1.
A Suécia enriqueceu quando seu governo era pequeno.
Sim, até 1960, o tamanho do governo sueco —
mensurado pelo volume de seus gastos em relação ao PIB — era menor até que o
do governo da Suíça.
Veja este quadro que mostra a evolução dos gastos do
governo elaborado pela revista The Economist. Toda a explosão
dos gastos do governo sueco (Sweden)
aconteceu entre as décadas de 1960 e 1980. A social-democracia é uma
consolidação da década de 1970.

No século entre 1850 e 1950, a população dobrou e a
renda real dos suecos decuplicou. A mortalidade infantil caiu de 15% para 2%, e
a expectativa de vida aumentou extraordinários 28 anos. Em
1950 a Suécia já era a quarta nação mais rica do mundo, não obstante a não-existência
de um estado assistencialista ou de qualquer grande controle estatal sobre os
setores da economia.
Como em qualquer outro país, o impressionante
estoque de capital da Suécia foi construído por empreendedores operando em um
sistema de livre mercado.
(Tudo isso foi relatado em detalhes neste
livro bem como neste excelente
tratado).
2.
Na Suécia, a tributação das empresas é das menores do mundo. E a tributação
indireta sobre os pobres é alta.
Ao contrário do que grande parte da esquerda acredita,
o estado de bem-estar social sueco é custeado de uma forma relativamente brutal:
jogando o fardo majoritariamente sobre os pobres e sobre a classe média.
Os suecos sabem que é impossível financiar um governo generoso
tomando dos ricos e das empresas — há muito poucos deles, e a economia depende
deles enormemente. Consequentemente, o governo da Suécia aufere grande parte de
suas receitas por meio dos altamente regressivos impostos sobre valor agregado
(o ICMS deles), a uma alíquota de 25% que
incide sobre cada bem ou serviço vendido — o único imposto que ricos e pobres
pagam exatamente o mesmo valor em coroas suecas.
Por outro lado, a alíquota máxima do imposto de
renda de pessoa jurídica é de apenas 22%
na Suécia (nos EUA é de 35%; no Brasil chega a 34%).
Mais: ao mesmo tempo em que o imposto sobre a renda
decresceu, o imposto sobre o consumo aumentou na Suécia.

A linha vermelha mostra a evolução dos impostos indiretos
(VAT e previdência social); a linha verde mostra a evolução dos outros impostos
(diretos); a linha azul são os impostos totais. Fonte: base de dados
tributária da OCDE e cálculos próprios.
Os ricos da Suécia usufruem várias vantagens
econômicas não oferecidas a seus compatriotas das classes mais baixas. A Suécia
sempre concedeu deduções fiscais bastante generosas para custos de capital. As
empresas suecas podem deduzir 50% de seus lucros para reinvesti-los no futuro,
o que os torna uma reserva isenta de impostos.
As regulamentações trabalhistas são modeladas para
beneficiar as grandes empresas (não há a imposição de salário mínimo, por
exemplo).
3.
A Suécia contrabalança seu estado assistencialista implantando políticas extremamente
pró-mercado em outras áreas da economia.
O ambiente empreendedorial da Suécia é extremamente desregulamentado e o país é
um dos mais abertos do mundo para o livre comércio. Você demora no máximo 6
dias para abrir um negócio e as tarifas de importação estão na casa de 1,3%, na
média.
A
dívida pública é baixa, o que significa que o governo não estoura o
orçamento.
O país adota um sistema nacional de vouchers escolares.
Não
há salário mínimo estipulado pelo governo.
Há uma robusta
proteção dos direitos de propriedade.
Como já dito, as
alíquotas de imposto de renda para pessoa jurídica são das mais baixas do
mundo.
O país está implantando um programa de privatização no
sistema de saúde, no sistema previdenciário, e na educação.
O IPTU é de 0,75%
do valor da propriedade até um valor máximo de 764 euros.
Não há impostos sobre a herança.
Como consequência, quando desconsideramos os gastos
do governo e se analisamos fatores como livre comércio, desregulamentação, política
monetária e direitos de propriedade, a Suécia é o oitavo país mais liberal do
mundo segundo Fraser
Institute.

4. Após a adoção do estado assistencialista
na década de 1970, a taxa de crescimento caiu. E muito.
Como dito, primeiro a
Suécia enriqueceu e acumulou muito capital (e tal tarefa foi auxiliada por uma
continuamente austera política monetária, que fez com que a Suécia jamais
conhecesse um período prolongado de alta inflação de preços). Depois, só
depois de ter enriquecido, é que o país começou a implantar seu sistema de
bem-estar social no final da década de 1960.
No entanto, o consumo
deste capital acumulado está erodindo a riqueza da Suécia.
O
gráfico abaixo mostra as taxas de crescimento da Suécia e da Dinamarca em
dois períodos: de 1920 a 1965 (antes da adoção do estado de bem-estar; barra
azul) e de 1966 a 2010 (após a adoção do estado de bem-estar; barra vermelha).

Para que uma economia que
faz uso maciço de políticas assistencialistas continue crescendo, sua
produtividade tem de ser muito alta. E para a produtividade ser alta, seu
capital acumulado já tem de ser muito alto. Apenas um alto grau de
capital acumulado pode permitir uma alta produtividade. Ou seja, o país tem de
já ser muito rico para adotar uma social-democracia duradoura. (Por isso, a social-democracia no Brasil
ainda é impossível.)
Apenas um país que já
enriqueceu, que já acumulou o capital necessário, e que já alcançou a
produtividade suficiente pode se dar ao luxo de adotar abrangentes políticas
assistencialistas.
Mas, ainda assim, tais políticas
cobram um preço. Por mais alta que seja sua produtividade, não dá para
continuar crescendo como antes. Mas, é tudo uma opção dos eleitores.
5. Há uma comparação que complica a situação
da Suécia.
Americanos de ascendência sueca são
39% mais produtivos, em termos per capita, do que os suecos que
permaneceram na Suécia (para os finlandeses em mesma situação, este valor chega
a 47%; para os dinamarqueses, 37%). Mais:
entre os americanos de origem sueca, a taxa de pobreza é
menor do que a taxa de pobreza de seus conterrâneos na Suécia.
Em termos mais abrangentes, renda dos escandinavos
que vivem nos EUA é de cerca
de 20% acima da média americana, e a taxa de pobreza, cerca de metade da média
americana.
Aparentemente, pode-se tirar os escandinavos da
Escandinávia, mas não a Escandinávia dos escandinavos. Há um legado cultural
que explica parte desse sucesso: uma cultura de confiança social, de relativa
ausência de corrupção, e uma ética de trabalho luterana.

A Suécia em um único gráfico
Por fim, um gráfico que praticamente resume tudo. Ele
está no trabalho acadêmico do professor Olle Krantz intitulado "Economic
Growth and Economic Policy in Sweden in the 20th Century: A Comparative
Perspective".
O gráfico mostra a evolução do PIB per capita da Suécia
em relação à média dos países europeus no período de 1870 a 2000. Perceba a brusca reversão a partir de 1950 e
a acentuada queda a partir de 1970.

Difícil constatação mais explícita do que essa sobre os efeitos do estado de bem-estar sobre o enriquecimento de um país.
Vale notar também que a economia sueca chegou ao ápice
em relação às suas vizinhas européias no auge da Segunda Guerra Mundial. A Suécia,
sempre é bom lembrar, não participou da guerra. Nenhuma lição aqui, apenas
notar que talvez não seja uma boa ideia ter suas indústrias bombardeadas.
Conclusão
A principal lição, que já deve estar abundantemente
clara, é que um estado de bem-estar social é uma receita garantida para o declínio.
Sim, se o país adotá-lo quando já estiver rico, ele pode durar bastante tempo;
mas ainda assim cobrará um preço claro em termos de crescimento econômico e
renda per capita.
O que talvez explique por que os estrategistas políticos
e econômicos da Suécia passaram os últimos 25 anos tentando reverter e abolir algumas
de suas políticas sociais.
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