A desigualdade de riqueza sempre existiu no mundo. Mas
ela nunca foi tão explícita e deletéria quanto na era feudal.
Naquele
mundo, quando alguém via uma plantação, ou um celeiro, ou um arado, ou animais
de carga, e perguntava a quem tais meios de produção serviam, a resposta é
"ao agricultor e sua família, e a ninguém mais". À exceção de
algum ocasional gesto de caridade dos proprietários, aqueles que não possuíam
meios de produção não podiam se beneficiar dos meios de produção existentes, a
menos que eles próprios de alguma maneira também se tornassem proprietários de
meios de produção. Eles não podiam se beneficiar dos meios de produção de
terceiros, a menos que os herdassem ou os confiscassem.
Com
a Revolução Industrial e a ascensão do capitalismo,
a realidade mudou. Os meios de produção dos mais ricos passaram a servir
diretamente aos mais pobres. A desigualdade continuou existindo, mas a pobreza absoluta passou a
desabar.
No
entanto, e curiosamente, a obsessão das pessoas com a
desigualdade de renda nunca foi tão premente como é agora, exatamente quando a
miséria absoluta está nas
mínimas históricas.
Economistas como Thomas Piketty e entidades
como a Oxfam pedem mais impostos sobre os ricos e mais controles e
regulamentações para "combater o capitalismo" e "acabar com as desigualdades
geradas por ele". Utilizando-se de uma metodologia altamente
questionável, a Oxfam quer "uma economia para os 99% da população mundial",
que "desconcentre" a riqueza do 1% mais rico da sociedade.
A contínua revolta contra
"os ricos" e os seguidos clamores para se confiscar uma substantiva
fatia de sua riqueza baseiam-se no velho princípio marxista de que há uma
pequena minoria de abastados vivendo à custa da exploração da esmagadora
maioria da população.
Tal raciocínio seria verdadeiro caso a revolta se
direcionasse especificamente para aqueles indivíduos cuja
riqueza foi adquirida por meios que atentam justamente contra o capitalismo,
como subsídios governamentais, protecionismo e outras formas de governo que
obstruem a livre concorrência.
No entanto, a gritaria tem sido generalizada e o
alvo comum tem sido "os ricos" de forma geral.
Eis o problema fundamental com esta postura: ela
desconhece por completo o papel que esse 1% desempenhou na melhora dos padrões
de vida e das condições de trabalho da humanidade.
O
grupo do 1%
Dos dez homens que encabeçam a lista dos mais ricos
do mundo, sete estão ligados às novas tecnologias. Na lista dos 500 mais
ricos do mundo publicada pela revista Forbes, Elon Musk (Tesla), Jeff Bezos (Amazon), Bill Gates (Microsoft), Larry Page (Google), Sergey Brin (Google), Larry Ellison (Oracle) e Steve Ballmer se destacam (Steve Jobs, da Apple, só não está ali porque já
morreu).
Isso os coloca no exclusivo grupo dos inovadores
tecnológicos, que diariamente nos assombram e surpreendem com suas criações. É
claro que suas inovações os deixaram incrivelmente ricos em relação a nós, mas
será que isso significa que eles nos deixaram mais pobres? Mais ainda: será que
isso significa que sua riqueza deveria ser confiscada?
Um estudo
publicado em 2004 pelo economista William Nordhaus, da Universidade de Yale, já
mostrava que "apenas uma pequena fração dos retornos derivados dos avanços
tecnológicos entre 1948 e 2001 foi capturada pelos produtores, o que indica que
a maior parte desses benefícios foi transferida aos consumidores".
Nordhaus estimou que os empreendedores inovadores
capturaram somente 2,2% do valor total que suas invenções criaram para a
sociedade. E isso muito antes da invenção do smartphone e dos tablets.
Ou seja, não há dúvidas de que Elon Musk, Bill Gates, Jeff Bezos e o falecido Steve Jobs se tornaram multimilionários com
suas criações. Porém, como já mostrava Nordhaus, o valor que eles criaram para
a sociedade com suas invenções é quase 40 vezes maior do que eles próprios
embolsaram.
E isso é algo que podemos ver e sentir diariamente.
A tecnologia da informação avança a passos mais do que agigantados, facilitando
e barateando incrivelmente a comunicação e as transações comerciais das empresas
e pessoas comuns. Esta redução nos custos da comunicação e do processamento de
informação possui um notável impacto não apenas na vida diária das pessoas como
também na produtividade das empresas.
Quando um computador custava US$ 10.000 (R$ 53.500) e a
comunicação era cara e lenta, quantas pequenas empresas podiam surgir e
prosperar? Hoje, em que um computador custa US$ 300 (R$ 1.600) e a comunicação
é instantânea e de baixíssimo custo, quantas pessoas podem empreender e crescer?
Tudo
isso foi gerado pelo avanço tecnológico possibilitado por esses bilionários.
Mais empresas, mais produção, mais emprego e menos pobreza.
Como diz Edward Conrad, autor do
livro "O
lado bom da desigualdade":
Dado
que os benefícios da inovação auferidos pelo público são muito maiores que os
lucros capturados pelos inovadores bem-sucedidos, surpreende a ânsia dos
defensores da redistribuição em maximizar os impostos cobrados dos inovadores.
Essas pessoas deveriam, isso sim, querer maximizar o ritmo destas inovações.
Quando a
desigualdade aumenta, a diferença de padrão de vida entre ricos e pobres
diminui
Apenas pense em Henry Ford, no falecido Steve Jobs,
no criador da Amazon Jeff Bezos e no empreendedor da informática Michael
Dell. Cada um destes se tornou extraordinariamente rico não por prejudicar
os pobres e a classe média, mas sim por saber transformar luxos que até então
eram usufruídos apenas pelos ricos — o automóvel, um smartphone (que, na
prática, é um supercomputador), um Shopping Center mundial que vende produtos
baratos a um clique, e o computador portátil — em bens corriqueiros acessíveis
a todos.
E, graças à globalização, os inventos desses
empreendedores não ficaram restringidos às suas fronteiras, mas se espalharam
por todo o mundo. Ao popularizarem seus inventos, esses três
empreendedores se tornaram extremamente ricos. Bem mais ricos que o resto
de nós, meros mortais. Houve um
aumento da desigualdade.
Mas esse aumento da desigualdade não apenas não foi
maléfico, como, na verdade, representou uma redução na
diferença de estilo de vida entre pobres e ricos. Quando essa desigualdade
aumentou, a diferença de padrão de vida entre ricos e pobres diminuiu. Por definição.
E é assim porque, como a história sobre a riqueza no
mundo deixa bastante claro, em economias de mercado, indivíduos se tornam
ricos majoritariamente à medida que suas inovações melhoram o padrão
de vida de todas as classes sociais. Eles só podem enriquecer —
aumentando a desigualdade de renda — se conseguirem satisfazer as necessidades
daquela maioria que não é rica.
Pense, por exemplo, no extraordinário valor de
mercado da Amazon, que catapultou Jeff Bezos para o posto de homem mais rico do
mundo. O valor da Amazon é uma função de Bezos ser capaz de servir, de
forma barata, aos desejos de todos os consumidores do planeta desde sua base em
Seattle, sem que a Amazon tenha uma
presença física na maior parte do globo. Por isso, a importância da
história da Amazon não pode ser minimizada.
O progresso sempre foi historicamente definido pelo
encolhimento do mundo por meio da tecnologia. À medida que a tecnologia
aproxima as pessoas (encolhendo o mundo), um número cada vez maior de indivíduos
se torna capaz de atender aos nossos infinitos desejos. É extremamente
emocionante lembrar que os melhores cérebros da humanidade trabalharam
fervorosamente para possibilitar e facilitar o comércio entre indivíduos que
não moram na mesma cidade e nem no mesmo país. Jaz aí a fonte de nossa imensa
riqueza atual.
Assim, será que realmente há algo de surpreendente
no fato de que a desigualdade aumentou nas últimas décadas? Eis um fenômeno que
realmente não deveria causar surpresa alguma. O que é realmente importante é
que esse aumento da desigualdade foi um efeito feliz e lógico de um aumento no
comércio global. Graças aos avanços nas comunicações e nos meios de transporte,
o empreendedor de hoje pode servir praticamente a todo o planeta (quando os
governos não atrapalham com escorchantes tarifas de importação).
Cem anos atrás, a genialidade de Bezos estaria
confinada ao noroeste dos Estados Unidos. Hoje, grande parte do planeta pode
usufruir seu talento e se beneficiar dele. O mesmo raciocínio vale para Apple,
Microsoft, Dell e todas as empresas de tecnologia.
Com a proliferação desta tecnologia que,
figurativamente, encolheu o mundo, as chances de mentes empreendedoras geniais
servirem aos desejos do mundo aumentaram exponencialmente. E, consequentemente,
também aumentaram as chances destas mentes geniais se tornarem
impressionantemente ricas. E, ao enriquecerem, tais pessoas também melhoram
nosso padrão de vida e nos enriqueceram.
Sim, elas nos enriqueceram. A riqueza, como disse o
economista Matt Ridley, é "a vida tornada mais fácil e confortável em
decorrência dos mercados, das máquinas, da tecnologia, e das outras pessoas".
Hoje, mesmo as pessoas mais pobres dos países ricos (e daqueles países cujos
governos não atrapalham severamente o livre comércio e a criação de riqueza)
têm acesso a confortos e amenidades que teriam assombrado os
bilionários de não muito tempo atrás: smartphones — que nada mais são do
que computadores de alta tecnologia que dão acesso a literalmente todo o
conhecimento existente no mundo — em seus bolsos; transporte barato com
motorista particular ao toque de um aplicativo; filmes e televisão em seus
tablets. Cito apenas esses três para não me alongar.
E, à medida que as pessoas vão enriquecendo, elas
valorizam mais a inovação. E, à medida que avança a globalização, e a
tecnologia da informação melhora nossa capacidade de nos comunicarmos, também
aumenta a capacidade das empresas e dos indivíduos de alcançar uma maior quantidade
de consumidores.
Assim, os inovadores que alcançam o êxito, como
Steve Jobs, Bill Gates e Jeff Bezos, enriquecem muito mais que os inovadores
que os antecederam no passado. E também se enriquecem muito mais que os
doutores, professores e motoristas de ônibus, pois os ganhos destes estão limitados ao número de
pessoas que podem servir.
O mesmo ocorre com os CEOs das empresas
multinacionais bem-sucedidas. Eles gerenciam negócios que mudam a vida de bilhões
de pessoas, e isso lhes traz uma remuneração de acordo.
Por isso, o aumento da desigualdade de renda é um
subproduto de um arranjo econômico que premia aqueles que direcionam seu
talento e sua riqueza de maneira mais efetiva. Quando um indivíduo tem êxito em
uma economia globalizada, seu enriquecimento pode até parecer desproporcionado,
mas o fato é que quem estipulou o valor de mercado deste indivíduo foram os próprios
consumidores de seus produtos.
Duas
histórias pouco difundidas
Jamais foi explicado por que seria deletério para a
economia indivíduos buscarem carreiras que, caso bem-sucedidos, os tornarão
muito mais desiguais em relação a seus pares. Levando ao extremo, se um
grupo de cientistas descobrir a cura definitiva para o câncer, e enriquecer
enormemente por causa dessa descoberta, os críticos da desigualdade terão de
exigir que essa descoberta seja revogada, pois levou a um aumento da
desigualdade.
Nessa mesma linha, Henry Ford morreu muito rico,
Steve Jobs morreu valendo bilhões, e Michael Dell vale dezenas de bilhões. Como
exatamente o fato de eles serem muito ricos prejudicou você? Alguém
realmente diria que o mundo estaria melhor caso estes três fossem meros
preguiçosos sem ambição? A
desigualdade, sem dúvida, seria menor.
Quando John D. Rockefeller começou
a vender querosene em 1870, ele detinha aproximadamente 4% do mercado. Já
em 1890, ele tinha 85% do mercado. Como ele conseguiu esse aumento estrondoso
de sua fatia de mercado? Foi espoliando os consumidores? Muito pelo contrário. Os
preços do galão de querosene desabaram: eram de 30 centavos em 1869 e despencaram para 6 centavos
em 1897. Rockefeller reduziu seus preços exatamente para aumentar sua fatia de mercado. Ao agir
assim, ele afastou a concorrência e aumentou estrondosamente sua riqueza. Mas,
simultaneamente, melhorou a qualidade de vida das pessoas. A Standard Oil de Rockefeller
tornou a gasolina tão barata, que possibilitou à Ford criar um mercado de massa
para o seu modelo T.
Já Henry Ford, por sua vez, duplicou
o salário básico de seus empregados em 1914. A lenda é que ele fez isso
para possibilitar a seus funcionários comprarem Fords. Falso. A verdade é que
ele aumentou o salário de seus empregados para diminuir a rotatividade deles. Em 1913, a rotatividade de
empregados na economia americana era de incríveis 370%. Ford, ao aumentar os salários
e diminuir a rotatividade, reduziu seus
custos trabalhistas, pois não mais tinha de treinar novos empregados. E, ao
fazer isso, sua riqueza aumentou exponencialmente. Mas a qualidade de vida de
seus consumidores também.
De novo: quando a disparidade de riqueza aumenta, a diferença
de padrão de vida diminui.
Conclusão
Embora sempre haverá pobres e ricos, a definição
moderna de "pobreza" é algo que certamente seria classificado como classe média
em 2005, e bilionário em
1905.
À medida que a desigualdade aumenta, a diferença de
padrão de vida entre pobres e ricos diminui. Óbvio: inovadores enriquecem em
virtude da comercialização daquilo que era um luxo no passado, e os inovadores
de hoje servem às necessidades de um número muito maior de pessoas.
Todos nós deveríamos querer viver em um mundo
repleto de empreendedores visionários e inovadores, que enriqueçam bastante em
decorrências de seus inventos que aumentam substantivamente nosso padrão de
vida. Quanto mais eles enriquecerem e mais financeiramente desiguais forem
em relação a nós, maior será o nosso padrão de vida e menor será
a diferença de estilo de vida entre eles e nós.
Por isso, para estimular a inovação e o crescimento,
é necessário permitir que os inovadores e empreendedores bem-sucedidos
mantenham a totalidade de sua renda, a qual a sociedade, voluntariamente, lhes
outorgou.
Punir o êxito com mais impostos logrará o objetivo
contrário. Haverá menos inovações, menos crescimento econômico e, logo, salários
mais baixos e mais pobreza.
É urgente passar a ver o lado positivo da
desigualdade. Por isso, a genuína preocupação não tem de ser com a pobreza
relativa, mas sim com a pobreza absoluta. E esta está sendo devidamente aniquilada
pelo capitalismo e pela globalização.
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globalização reduziram os preços e trouxeram progresso para todos
Em
qualquer discussão sobre desigualdade, estas são as quatro perguntas que têm de
ser feitas
O
grande beneficiado pelo capitalismo foi o cidadão comum, e não os ricos e
poderosos
Seu
padrão de vida hoje é muito maior do que o de um magnata americano há 100 anos