N.
do T.: o debate nos EUA sobre a estatização do sistema de saúde torna-se a cada
dia mais agressivo. Diariamente ocorrem
protestos contrários a essa proposta, com o governo americano classificando-os
como "protestos nazistas". O artigo a
seguir faz uma análise econômica dos problemas da medicina socializada, tomando
como exemplo a menina dos olhos do governo Obama: o sistema de saúde canadense. É interessante constatar que os problemas que
afligem os canadenses são muito parecidos àqueles que fustigam os usuários do
nosso SUS. O que não é nada
surpreendente, aliás. Afinal, as leis
econômicas são as mesmas, independente da latitude.
O primeiro passo do governo americano
em sua tentativa de criar um monopólio estatal do sistema de saúde foi propor
uma lei que iria, ao fim e ao cabo, abolir a indústria privada de seguro de
saúde. O plano do governo é criar
impostos adicionais e impor custos obrigatórios sobre as empresas de seguro-saúde,
ao mesmo tempo em que uma burocracia estatal de seguro-saúde será criada
ostensivamente para "concorrer" com as empresas privadas. O resultado final esperado é um enorme
monopólio estatal que, assim como todos os monopólios estatais, irá operar com
toda a eficiência dos Correios e todo o charme e compaixão da Receita Federal.
Obviamente, é muito difícil competir
com um rival que tem todo o seu capital e custos operacionais pagos pelo
contribuinte. Sempre que o governo decide
"concorrer" com o setor privado, ele trata de garantir que a competição seja
francamente injusta, criando regulamentações e impostos em cascata sobre as
empresas privadas, ao mesmo tempo em que se isenta a si próprio de todos esses
entreveros. É por isso que as "empresas
apadrinhadas pelo governo" Fannie
Mae e Freddie Mac foram tão lucrativas durante vários anos. É por isso também que muitas escolas
"públicas", cujos resultados são escabrosos, se mantêm em existência por décadas,
não obstante seu fracasso absoluto em educar as crianças.
O FUTURO DA MEDICINA AMERICANA
Alguns anos atrás, o economista
ganhador do Prêmio Nobel Milton Friedman estudou a história da oferta de
serviços de saúde nos EUA. Em um estudo
de 1992 publicado pela Hoover Institution,
intitulado Input and Output in Health
Care (Insumo e Produto no Sistema de Saúde), Friedman observou que, em
1910, 56% de todos os hospitais dos EUA eram de gerência privada e voltados
para o lucro. Após 60 anos de subsídios
direcionados aos hospitais geridos pelo governo, esse número havia caído para
10%. Demorou décadas, mas no início dos
anos 1990 o governo já havia tomado o controle de quase toda a indústria
hospitalar.
Aquela pequena porção da indústria que
ainda permanece voltada para o lucro é regulada de modo tão extraordinariamente
violento pelos governos federal, estaduais e municipais, que a maioria das
decisões tomadas pelos administradores desses hospitais tem mais a ver com o
cumprimento das regulamentações do que com a oferta lucrativa de serviços ao
pacientes/clientes. E é o lucro,
obviamente, o que possibilita que os hospitais do setor privado tenham os meios
para ofertar seus serviços de saúde.
A conclusão primordial de Friedman foi
que, como em todos os sistemas burocráticos estatais, o sistema de saúde gerido
ou controlado pelo governo criou uma situação em que um aumento dos "insumos" -
tais como gastos em equipamentos, infraestrutura e salários dos profissionais
médicos - levou na realidade a uma queda
nos "produtos" (no caso, em termos de quantidade de serviços médicos
ofertados). Por exemplo, ao passo que os
gastos médicos estatais subiram 224% no período 1965-1989, o número de leitos
hospitalares por 1.000 habitantes caiu 44%, e o número de leitos ocupados
declinou 15%. Da mesma forma, durante
esse período de quase completo domínio governamental sobre a indústria
hospitalar (1944-1989), os custos por paciente-dia subiram quase 24 vezes,
ajustados pela inflação.
Quanto mais o governo gastou dinheiro
no sistema de saúde por ele gerido, menos serviços de saúde foram ofertados. Esse tipo de resultado é geralmente válido
para todas as burocracias estatais, pois elas não estão submetidas a nenhum
mecanismo de mercado; não há o mecanismo de retroinformação via sistema de
preços. Como no setor estatal não há
lucros em um sentido contábil, não há, por definição, nenhum mecanismo que
premie a boa performance e puna a má.
Com efeito, em todos os empreendimentos estatais vale o oposto: a má
performance (incapacidade de atingir resultados ostensivos, ou de satisfazer os
"clientes") é tipicamente premiada com
maiores orçamentos. O fracasso em
educar crianças faz com que o governo despeje mais dinheiro nas escolas
públicas. O fracasso em reduzir a
pobreza leva a maiores orçamentos para as burocracias assistencialistas. Isso certamente acontece também com a
medicina socialista.
Os custos sempre explodem toda vez que
o governo se envolve em algo - e os governos sempre mentem sobre isso. Em 1970, por exemplo, o governo americano
previu que a parte do Medicare [programa que reembolsa hospitais e médicos
por tratamentos fornecidos a indivíduos acima de 65 anos de idade] que
cobre os seguros hospitalares seria de "apenas" $2,9 bilhões por ano. Considerando-se que as despesas reais foram
de $5,3 bilhões, houve aí uma subestimação de custos de nada menos que
79%. Em 1980, o governo previu que esses
gastos seriam de $5,5 bilhões; os gastos reais foram mais de quatro vezes essa
quantia - $25,6 bilhões. Essa explosão
dos custos burocráticos fez com que o governo tivesse de criar 23 novos impostos
nos primeiros 30 anos do Medicare. (Veja Ron Hamoway, "The
Genesis and Development of Medicare", in Roger Feldman, ed., American
Health Care, Independent Institute, 2000, pp. 15-86). A
administração Obama alega que a transferência do sistema de saúde para o
controle estatal irá, de alguma forma, reduzir
magicamente os custos. É claro que tal
insensatez não deve ser levada a sério.
O governo nunca, jamais, em lugar algum, reduziu os custos de se fazer
algo.
Todos os monopólios estatais dos
serviços de saúde, sejam eles no Canadá, no Reino Unido ou em Cuba, vivenciaram
uma explosão tanto nos custos quanto na demanda - uma vez que os serviços são
"gratuitos". A medicina socializada não
é de fato gratuita, é óbvio; os verdadeiros custos estão meramente escondidos,
já que são pagos por impostos.
Sempre que algo tem um preço
explicitamente zero associado a ele, a demanda do consumidor irá aumentar
substancialmente - e os serviços de saúde não são exceção. Ao mesmo tempo, as malversações burocráticas
irão garantir que as ineficiências grotescas piorem a cada ano. À medida que os custos vão ficando fora de
controle e começam a constranger os políticos que prometeram aos cidadãos um
"almoço grátis" no sistema de saúde, eles recorrem àquilo que todos os governos
sabem fazer tão bem: impor controle de preços, provavelmente sob algum
eufemismo do tipo "controle global do orçamento"
Controle de preços - ou as leis que
forçam os preços a ficarem abaixo do seu nível de equilíbrio de mercado (onde
oferta e demanda se igualam) - artificialmente estimulam a quantidade demandada
pelos consumidores ao mesmo tempo em que reduzem a oferta, pois fazem com que
não seja lucrativo ofertar a mesma quantidade de antes. O resultado de um aumento na demanda e uma
redução na oferta é a escassez. O
racionamento de produtos torna-se necessário.
Isso significa que são os burocratas do governo - e não os indivíduos e
seus médicos - que passam a determinar quem irá e quem não irá receber
tratamento médico, que tipo de tecnologia médica estará disponível, quantos
médicos haverá, e por aí vai.
Todos os países que adotaram um
sistema de saúde socializado sofrem da doença da escassez induzida pelo
controle de preços. Se um canadense, por
exemplo, sofrer queimaduras de terceiro grau em um acidente automobilístico e
precisar de uma cirurgia plástica reconstrutora, o tempo médio de espera pelo
tratamento será de mais de 19 semanas, ou aproximadamente cinco meses. O tempo de espera para uma cirurgia
ortopédica no Canadá também é de quase cinco meses; para uma neurocirurgia é necessário
esperar três meses completos; e leva-se mais de um mês para uma cirurgia
cardiovascular (veja a publicação do think-tank canadense Fraser Institute, Waiting
Your Turn: Hospital Waiting Lists in Canada). Pense nisso: se o seu médico descobrir que
suas artérias estão entupidas, você terá de esperar na fila por mais de um mês,
com a possibilidade iminente de uma morte por ataque cardíaco. É por isso que tantos canadenses vão para os
EUA em busca de tratamento médico.
Todos os grandes jornais americanos
(bem como toda a grande mídia mundial) aparentemente se tornaram nada mais do
que líderes de torcida do governo Obama, por isso é difícil encontrar alguma
informação sobre a falência da medicina estatal canadense. Mas se regredirmos alguns anos, as informações
se tornam bem mais abundantes. Um artigo
no The New York Times de 16 de
janeiro de 2000, intitulado Full
Hospitals Make Canadians Wait and Look South [Hospitais Lotados Fazem os
Canadenses Esperar e Olhar Para o Sul], escrito por James Brooke, fornece
alguns bons exemplos de como o controle de preços no Canadá criou sérios
problemas de escassez.
- Uma
senhora de 58 anos esperava por uma cirurgia cardiovascular no saguão de um
hospital de Montreal junto a outros 66 pacientes. As portas elétricas abriam e fechavam durante
toda a noite, permitindo a entrada de correntes de ar com temperaturas em torno
de -18°C. Ela estava em uma lista de
espera de cinco anos para sua cirurgia.
- Em
Toronto, em um único dia, 23 dos 25 hospitais da cidade deixaram suas
ambulâncias paradas por causa de uma escassez de médicos.
- Em
Vancouver, ambulâncias permaneciam abandonadas por horas enquanto vítimas de
ataques cardíacos aguardavam dentro delas, à espera de serem adequadamente
atendidas.
- Pelo menos
1.000 médicos canadenses e dezenas de milhares de enfermeiras canadenses
migraram para os EUA para evitar o controle de preços sobre seus salários.
Escreveu o jornalista, "Poucos
canadenses recomendariam seu sistema como modelo de exportação".
As escassezes induzidas pelo controle
de preços no Canadá também se manifestam no escasso acesso à tecnologia
médica. Per capita, os EUA têm oito
vezes mais máquinas de ressonância magnética, sete vezes mais unidades de
radioterapia para tratamentos de câncer, seis vezes mais unidades de litotripsia,
e três vezes mais unidades de cirurgia cardiovascular. Existem mais scanners de ressonância
magnética no estado de Washington, cuja população é de cinco milhões de
pessoas, do que em todo o Canadá, cuja população é de mais de 30 milhões de
indivíduos (Veja John Goodman e Gerald Musgrave, Patient Power).
Da mesma forma, no Reino Unido -
graças à nacionalização, ao controle de preços e ao racionamento governamental
dos serviços de saúde - milhares de pessoas morrem desnecessariamente a cada
ano por causa da escassez de unidades pediátricas de tratamento intensivo, de
máquinas de diálise, de marcapassos e até mesmo de máquinas de raios X. Esse será o futuro da América caso a
"medicina obâmica" se torne uma realidade.
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