Qual
exatamente é o arranjo que gera incentivos para que políticos sejam corruptos? Mais: existe realmente uma maneira de ser diferente?
O
intuito aqui é estabelecer uma teoria direta e concisa sobre a corrupção.
O
poder do estado -- e, por conseguinte, o poder daqueles que detêm cargos de
poder dentro da máquina estatal -- é o poder de pilhar, usurpar e dar
ordens. Quem detém o poder estatal detém a capacidade de se
locupletar. A capacidade de se locupletar estando dentro da máquina
estatal é a definição precípua de corrupção. A corrupção sistemática
necessariamente acompanha um governo. Ela está presente na história de
absolutamente todos os governos. Varia apenas a intensidade e o grau de
exposição e de denúncia pela mídia.
A
teoria por trás destas conexões é simples.
Em
primeiro lugar, o governo detém o monopólio da criação de legislações e emendas orçamentárias. E tal monopólio gera oportunidades para se roubar legalmente. Roubar legalmente significa aprovar uma lei, regulamentação ou emenda orçamentária que favoreça um
determinado grupo à custa de todo o resto da economia, principalmente os
pagadores de impostos.
Em
segundo lugar, o governo, munido do dinheiro que coleta de impostos, detém o
monopólio da escolha das empresas que farão as obras públicas que o governo
julga adequadas. Esse processo de
escolha, que dá à empresa vencedora acesso livre ao dinheiro da população --
algo que não ocorre no livre mercado -- é outra forma de roubo legalizado.
Grupos
de interesse -- por exemplo, grandes empresas, empreiteiras ou empresários com
boas ligações políticas -- ansiosos por adquirir vantagens que não conseguem
obter no livre mercado irão procurar determinados políticos e fazer lobby para
"convencê-los" a aprovar uma determinada legislação que lhes seja
benéfica, ou para pressionar que sua empresa (ou empreiteira) seja a escolhida
para uma obra pública.
A
legislação pode ser desde a imposição de tarifas de importação até a criação de regulamentações que irão dificultar a entrada de novos
concorrentes em um mercado específico. Pode também ser uma mera emenda orçamentária que irá
beneficiar alguma empreiteira que será agraciada com a concessão de alguma obra
pública.
Mas
há um problema: se esses legisladores não cobrarem um preço pelo seu voto
favorável -- isto é, se o custo para se fazer lobby for zero --, então a
demanda por legislações específicas será infinita. Igualmente, se os políticos não cobrarem um preço das empreiteiras escolhidas para fazer as obras
públicas, a demanda por obras públicas da parte das empreiteiras também será
infinita.
Sendo
assim, os legisladores terão de cobrar caro pelo seu voto com o intuito de
estabelecer parâmetros para os espertalhões que estão brigando pelo seu voto
favorável; e os políticos terão de cobrar um preço alto
para fraudar o processo de licitação em prol de uma determinada empreiteira.
Para
ambos os casos, o preço inclui contribuições de campanha, dinheiro em contas no
exterior, favores corporativos, publicidade favorável, e vários outros. Suborno e propina são apenas as formas mais cruas desse leilão.
[N. do E.: no escândalo da Petrobras (o Petrolão), o dinheiro saía do caixa da estatal,
pagava obras superfaturadas e, o que restava, voltava para o bolso dos
políticos que estavam no comando da empresa na forma de propina paga por
empreiteiros. O esquema foi detalhado neste artigo].
Em
todos esses casos, o dinheiro público estará sendo desviado e desperdiçado,
seja em obras superfaturadas, seja na criação de burocracias desnecessárias e
que irão apenas encarecer os preços dos bens e serviços e reduzir sua
qualidade. E quanto maior o volume de dinheiro público desviado, maior é
a fatia que acaba indo parar no bolso desses próprios políticos.
O
fato é que o voto destes políticos em prol da criação destas legislações anti-mercado
ou destas emendas orçamentárias, bem como o fato de políticos comandarem
estatais e escolherem as empreiteiras que farão suas obras, são um bem
econômico para essas empresas.
O
resultado final é uma corrupção endêmica que não pode ser eliminada. E
ela será tanto maior quanto maior for o tamanho e o escopo do estado. Não
existe algo como um governo limpo e transparente.
Senadores,
deputados e burocratas reguladores -- todos estão, de uma forma ou de outra,
propensos a esta atitude. Mesmo um político ou burocrata que seja
genuinamente honesto pode ser acusado de conivência, pois não irá denunciar
seus colegas.
Roubo
e corrupção perpassam o governo em todas as suas atitudes e medidas. Todas as atitudes e medidas do governo sempre envolvem mentiras, injustiças,
malversações, delitos, propinas, subornos, favorecimentos, fraudes,
deturpações, negociatas, emendas favoráveis e exploração. E essas são
apenas as coisas publicáveis.
A
corrupção, aliás, já começa pela linguagem. "Contribuições de
campanha" ou "doações" são apenas um eufemismo para
'propina'. Quem dá dinheiro a políticos o faz ou porque acredita no que
eles dizem defender ou porque espera influenciar seus votos legislativos. Tais pessoas sempre esperam ganhar algo que necessariamente virá à custa de
outros.
Políticos que recebem contribuições de campanha se tornam meros
porta-vozes dos interesses de seus financiadores. O dinheiro irá ajudar o
candidato a criar uma coalizão que poderá usar o poder do estado em benefício
de um determinado grupo de interesse sem sofrer nenhuma resistência
excessiva. Afinal, trata-se de um roubo legalizado.
Conclusão
A
grande arte da política está em conseguir, simultaneamente, aplausos dos
favorecidos e apoio dos que estão sendo roubados.
O
político, em suma, gerencia um esquema de extorsão semelhante ao da máfia. Seu
salário é pago pelas vítimas, ou seja, pelos pagadores de impostos que não têm
voz ativa. Seus "complementos salariais" -- o chamado "por
fora" -- são pagos por grupos de interesse, o que fará com que ele espolie
ainda mais os pagadores de impostos. Tudo é feito com grande astúcia,
sendo a função do político convencer as vítimas de que elas não estão sendo
espoliadas. Isso ele sempre consegue. O político é, acima de tudo,
um falso.
Corrupção
sistemática -- não apenas a corrupção que envolve meios financeiros, mas também
a corrupção da linguagem e das atitudes -- necessariamente acompanha um
governo. Qualquer governo. E a corrupção é endêmica porque a
política é a arte da ladroagem.
Quando
eleito, um político irá se esforçar para garantir seus interesses e os
interesses de seus financiadores da melhor forma possível. Para que mais
serve um governo? Governo é roubo. Governo é corrupção.