Eis uma notícia, de 14 de janeiro, que não está
recebendo a devida atenção:
Está pronta para entrar na pauta de votação da Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) a PEC 89/2015, que reduz de 44 horas para 40 horas a jornada semanal
de trabalho no país. A proposta, de autoria do senador Paulo Rocha (PT-PA), tem
parecer favorável do senador Walter Pinheiro (PT-BA). Se aprovada na comissão,
segue para análise em Plenário.
Segundo
o autor da proposta, jornadas mais reduzidas permitem a melhora nos índices de
saúde e de segurança no trabalho, trazem benefícios para toda a família do
trabalhador, servem para promover a igualdade entre os sexos, aumentam a
produtividade nas empresas e dão ao trabalhador opções de lazer e de
aperfeiçoamento. Além disso, argumenta Paulo Rocha, a redução da jornada
permitiria a repartição melhor do mercado de trabalho, reduzindo o desemprego e
melhorando a distribuição da renda.
Esse projeto já foi testado em alguns países
mundo afora, sempre com resultados muito diferentes do esperado.
Há dezesseis anos, a França aprovou dispositivo
legal que reduziu a jornada
semanal de trabalho de 40 para 35 horas. Conhecida como "Lei
de Aubry" -- numa referência direta à ex-ministra socialista do trabalho
Martine Aubry --, a estrovenga foi saudada como um marco histórico na caminhada
daquele país rumo ao pleno emprego -- uma das maiores e mais veneradas utopias
socialistas.
Após todos esses anos, no entanto, a taxa de
desemprego por lá não só não caiu como
apresentou um discreto aumento. Como era de se esperar, pesquisas recentes
mostram que mais de 60% dos franceses são hoje favoráveis à revogação da tal lei.
Nunca é demais rememorar uma das mais importantes
lições do grande Frédéric Bastiat:
Na esfera econômica, um ato, um hábito,
uma instituição, uma lei não geram somente um efeito, mas uma série de efeitos.
Dentre esses, só o primeiro é imediato. Manifesta-se simultaneamente com a sua
causa. É visível. Os outros só aparecem depois e não são visíveis. Podemos nos
dar por felizes se conseguirmos prevê-los. (…) Entre um bom e um mau economista
existe uma diferença: um se detém no efeito que se vê; o outro leva em conta
tanto o efeito que se vê quanto aqueles que se devem prever.
É famosa também a história
segundo a qual Milton Friedman, em viagem à China comunista, deparou-se com um
grupo de centenas de homens que construíam uma pequena barragem de terra,
munidos exclusivamente de pás e enxadas. Ele comentou então com o oficial
chinês que o acompanhava que apenas um operário, de posse de uma máquina
escavadeira, poderia executar toda aquela empreitada num tempo bem mais curto.
A resposta do astuto oficial -- mal escondendo um
sorriso sarcástico no canto dos lábios -- foi: "sim, mas imagine todo o
desemprego que isso acarretaria". Estupefato com a resposta, o grande
economista de Chicago pensou: "se são empregos que desejam, melhor
seria que lhes tirassem as pás e dessem-lhes colheres".
O raciocínio do chinês é o mesmo que infesta a mente
de muitos dos nossos socialistas, para quem o trabalho é um fim em
si mesmo e não um meio para a obtenção do verdadeiro
fim, que é o aumento do bem-estar geral, obtido por meio do gradativo aumento
do poder de compra de cada indivíduo (produtividade).
Ao se reduzir em 10% a jornada máxima, pretende-se, por
meio de um decreto estatal, colocar 11 homens para fazer o trabalho que hoje é
feito por 10. Seria uma tentativa, dentre outras, de reduzir o desemprego. O
argumento é o de que, se cada empregado tiver de trabalhar menos, os patrões
serão obrigados a contratar mais apenas para manter toda a produção.
Abordemos, então, esse assunto de maneira franca e
direta: leis impondo uma redução na jornada semanal de trabalho irão prejudicar exatamente aqueles trabalhadores
que elas supostamente deveriam proteger.
Esse tipo de regulação, na realidade, prejudica a
capacidade dos trabalhadores de ganhar um salário decente.
O argumento dos defensores dessa medida é o
seguinte: se um patrão puder obrigar João a trabalhar 44 horas, ele fará isso; por
outro lado, se ele for proibido disso, de modo que João só possa trabalhar no
máximo 40 horas semanais, então o patrão será obrigado a contratar mais uma
pessoa para ajudar João.
Só que tal raciocínio está errado por três
motivos.
Em primeiro lugar, o trabalhador contratado para
ajudar João não será tão eficiente quanto João (afinal, se ele fosse, então,
por uma questão de lógica, o patrão já o teria contratado de qualquer
maneira). Sendo assim, transferir parte do trabalho de João para esse
recém-contratado fará com que a empresa seja menos eficiente. Isso pode
significar preços mais altos, menor produção, menos capacidade de investimento
e expansão, ou todos os três.
Em segundo lugar, essa medida serve apenas para
ajudar os desempregados à custa dos empregados. Se João
quisesse ou necessitasse de trabalhar mais horas, azar o dele. Ele acabou
de sofrer um corte salarial de 9% para que o outro pudesse ser contratado.
Em terceiro, e o mais importante de todos, trabalhadores
são pagos de acordo com o que produzem, de modo que, se não estão trabalhando e
produzindo o suficiente, não há como eles ganharem o suficiente. Empresas
não são instituições de caridade; se um empregado produz 100, não há como ele
ganhar mais do que 100. Logo, se o tempo de produção diminui, então o salário também tem de diminuir. Sendo assim, leis que impõem uma jornada máxima reduzem a
capacidade dos trabalhadores de aumentar seus salários, o que poderia ocorrer
caso eles trabalhassem mais e produzissem mais.
Isso é algo que os próprios sindicatos já haviam
reconhecido no século XIX. Terence
Powderly, líder do sindicato americano Knights of Labor (o
maior e mais importante do país na década de 1880), afirmou que os
trabalhadores não queriam jornadas menores se isso implicasse uma redução
salarial. Mas foi exatamente isso o que as greves e as leis trabalhistas
criaram.
Por fim, desnecessário dizer que, se o governo
impuser uma redução da jornada e, ao mesmo tempo, proibir reduções salariais, o
resultado será o desemprego (vide a França) e a estagnação. Com menos produção
e mais custos, não haverá muito dinheiro para as empresas fazerem novos
investimentos e se expandirem.
Conclusão
Nos países ricos, em que os trabalhadores possuem
uma grande quantidade de maquinários e bens de capital tecnológicos à sua
disposição, tais trabalhadores tendem a ser mais produtivos. Sendo assim,
eles podem se dar ao luxo de trabalhar menos horas. Já nos países ainda
em desenvolvimento, que não usufruem de bens de capital abundante e de
qualidade para seus trabalhadores -- o que faz com que eles sejam menos
produtivos --, não há alternativa senão trabalhar mais para produzir o mesmo
tanto que um trabalhador de um país desenvolvido. (Mais detalhes sobre isso neste artigo).
Essa tabela (fonte),
que mostra a quantidade anual de horas trabalhadas por país, diz tudo:

De resto, se o objetivo é criar empregos, há
melhores alternativas do que jogos de soma negativa que punem tanto
trabalhadores quanto empresários.
Apenas para ficar claro: uma jornada semanal de 30
horas em países ricos e de 35 horas em países em desenvolvimento não é
impossível e nem mesmo é indesejável. Mas se o objetivo é ajudar os
trabalhadores, a melhor alternativa é deixar que cada um decida o melhor para
si, e não políticos.
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Julian
Adorney é diretor de marketing da Peacekeeper, um aplicativo
de smartphone que oferece uma alternativa para serviços de emergência. É
também historiador econômico, tendo como base a economia austríaca. Já
publicou nos sites do Ludwig von Mises Institute do EUA, Townhall, e The Hill.
João
Luiz Mauad é administrador de empresas
formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor doInstituto Liberal. Escreve para
vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta
do Povo.