O ministro das Relações Exteriores José Serra disse,
com grande profundidade filosófica, que "o Brasil não é uma economia mais
fechada do que a média mundial, apesar do folclore encontrado. Isso é
folclore."
E prosseguiu,
exsudando cientificidade: "Quando alguém te disser [que a história mostra uma
posição muito fechada do Brasil], pode dizer o seguinte: 'o ministro de
Relações Exteriores disse que essa sua afirmação é folclórica'."
Intelectualismo avassalador.
Eis os fatos nada folclóricos: segundo
a Câmara Internacional de Comércio, o Brasil é a economia mais fechada
do G-20 e uma das
mais protecionistas do mundo. Em um
ranking das 75 maiores economias do mundo, que representam quase a
integralidade do comércio internacional, o Brasil aparece apenas na 68.ª
posição entre os mais abertos. Apenas oito países seriam mais fechados que o
Brasil, entre eles potências como Quênia, Paquistão e Venezuela.
Ao passo que a média de importações dos países do
G-20 é de 27,5% do PIB, o Brasil importa apenas 14% do PIB.
Aquilo que já era ruim piorou ainda mais durante o
governo Dilma. Com a justificativa de
estar "estimulando" a indústria, o governo praticamente fechou os portos
e aumentou
as alíquotas de importação de praticamente todos os produtos estrangeiros:
automóveis, pneus, produtos têxteis, calçados, brinquedos, lâmpadas, sapatos
chineses, tijolos, vidros, vários tipos de máquinas e até mesmo de produtos
lácteos.
As consequências do fechamento da nossa economia são
diariamente vivenciadas por todos nós, que ficamos praticamente proibidos de
ter acesso a produtos bons e baratos feitos no exterior, e nos tornamos reféns
do grande empresariado nacional, protegido pelo governo.
Ao elevar as tarifas de importação, o intuito do governo
é proteger as empresas nacionais e blindá-las contra os desejos dos
consumidores -- principalmente dos mais pobres, que ficam sem poder aquisitivo
para comprar produtos bons e baratos feitos no exterior.
Agindo desta maneira, o governo cria uma reserva de
mercado para o poderoso empresariado nacional, o qual agora, sem a concorrência
externa, se sente mais livre para cobrar preços altos e oferecer produtos de
pior qualidade. Não sobra alternativa para os consumidores senão consumir
os produtos deste baronato nacional.
Para protecionistas como Serra, as indústrias
nacionais não devem ser submetidas à liberdade de escolha dos consumidores
nacionais. Os consumidores não devem ter o direito de escolher produtos
estrangeiros. Eles devem ser obrigados a comprar apenas os produtos nacionais
mais caros.
Sem a concorrência de produtos estrangeiros, e com
aqueles cidadãos mais pobres podendo comprar apenas produtos mais caros
fabricados nacionalmente, os grandes empresários industriais do país não têm
motivo nenhum para reduzir seus preços e elevar a qualidade de seus
produtos. Eles passam a usufruir um mercado cativo. Consequentemente, torna-se mais difícil
controlar a inflação de preços.
E os consumidores, principalmente os mais pobres,
passam a ser tratados como gado em um curral: ficam proibidos de comprar produtos
estrangeiros baratos e são obrigados a comprar apenas os produtos nacionais
mais caros desses empresários privilegiados.
Enquanto os lucros destes se tornam inabalados, a
renda disponível dos mais pobres vai definhando.
Este excelente site tem
uma calculadora que permite você calcular, por estado, quanto irá pagar de
tributos ao importar um bem. Por
exemplo, se você mora no estado de Minas Gerais e decidir importar um produto
que custa US$ 1.000 (R$ 3.220) mais US$ 50 de frete, você pagará R$
3.216 só de tributos, o que dá quase 100% do preço do
produto.
O preço final total será de R$ 6.597. Ou seja, as indústrias nacionais estão sem
nenhuma concorrência estrangeira.
Clique no site,
faça pesquisas por estados, e teste a resistência do seu estômago. E veja
também este
site, que dá mais detalhes sobre a tributação.
Tarifas
são impostos - e geram as mesmas consequências
Contrariamente ao que dizem os protecionistas, o
livre comércio não apenas não causa desemprego, como também ajuda quem está
procurando emprego.
Quando as importações "baratas" expulsam do mercado
aqueles produtos nacionais mais caros ou de menor qualidade, os consumidores
nacionais ficam com mais dinheiro. Tendo
acesso a produtos mais baratos, o total despendido com gastos em consumo
diminui. Sobra mais dinheiro ao fim do
mês.
Com mais dinheiro sobrando, as pessoas podem ou
investir ou gastar mais em outros produtos e serviços. Se você gasta menos comprando bens importados
mais baratos, sobre mais dinheiro para você gastar em outros setores da
economia. E sobra mais dinheiro para
você investir (mesmo que seja aplicando em um CDB de banco, pois esse dinheiro
será emprestado para terceiros investirem) e, com isso, gerar empregos em
outros setores.
Com mais investimento e com mais demanda em outros
setores, emprego e produção crescem.
Consequentemente, a população se torna agora mais
rica e com maior oferta de bens e serviços.
Trabalhadores demitidos daquelas indústrias ineficientes que perderam
mercado para os produtos importados têm agora novas oportunidades em outros
setores.
E isso não é apenas uma questão de teoria, não. A própria empiria confirma isso.
O quadro abaixo, elaborado pelo economista argentino
Iván
Carrino, mostra os países que têm a maior abertura comercial de acordo com
a pontuação (de 0 a 100) -- estabelecida pelo Índice de Liberdade Econômica
da Heritage Foundation -- e a taxa de desemprego de cada um
deles para o ano de 2015.

À exceção da Bulgária -- que nunca foi um exemplo de
país historicamente estável --, a conclusão a partir dos dados é clara: o
desemprego não tem nada a ver com a abertura econômica. Como mostram os 4
primeiros países, quanto mais aberto ao comércio, menor a
taxa de desemprego.
Uma
análise mais extensa indica que os países mais abertos ao comércio
internacional não apenas não têm problemas de emprego, como também são, em
média, 5 vezes mais ricos do que aqueles que decidem impor travas e barreiras à
liberdade de seus cidadãos de importarem bens do exterior.
A lógica é direta: tarifas são impostos sobre vendas
que se aplicam a bens estrangeiros. As
empresas estrangeiras são tributadas para que suas concorrentes domésticas --
que são isentas desta tributação -- possam livremente aumentar seus preços de
maneira generalizada.
Tendo agora de pagar mais caro por produtos
nacionais de qualidade mais baixa, os consumidores nacionais estarão
incapacitados de consumir mais e de investir mais. A restrição às importações e a reserva de
mercado criada por ela faz com que a capacidade de consumo e de investimento da
população seja artificialmente reduzida.
E sempre que a capacidade de consumo e de
investimento da população é artificialmente reduzida, lucros e empregos
diminuem por toda a economia.
Assim, empregos de baixa produtividade nas indústrias
protegidas são mantidos à custa de empregos de alta produtividade em empresas
que tiveram suas vendas reduzidas por causa da queda da capacidade de consumo e
de investimento das pessoas.
Logo, toda a economia se torna mais ineficiente, a
produção diminui, os preços médios aumentam, e os salários reais caem.
Exatamente o cenário brasileiro atual.
Adicionalmente, tarifas protecionistas também afetam
as empresas domésticas que precisam importar bens de capital e maquinários
modernos para incrementar sua produtividade e, com isso, fabricar produtos
melhores e mais baratos. Tarifas as
obrigam a pagar mais caro por seus insumos ou então a comprar insumos nacionais
mais caros e de pior qualidade.
Isso reduz sua produtividade e aumenta seus
custos. Sendo menos produtivos e
operando com custos maiores, essas empresas se tornam menos competitivas
internacionalmente.
Consequentemente -- e essa é uma das consequências
não previstas do protecionismo --, as exportações também tendem a declinar. E estimular exportações era exatamente uma
das intenções do protecionismo.
De novo, esse é exatamente o cenário brasileiro.
Tarifas
são imorais e anti-humanas
Eis o fato básico: tarifas de importação são
impostos. Dizer que tarifas de
importação estimulam a economia equivale a dizer que impostos estimulam a
economia. Nem mesmo um fanático desenvolvimentista
como José Serra pode acreditar nessa tese.
Barreiras comerciais são boas para garantir os
lucros das indústrias protegidas e para manter os salários de seus empregados
sindicalizados. Mas prejudicam todo o
restante dos consumidores. Não importa
qual seja o grau de restrição ao comércio: a prosperidade geral sempre será
reduzida. Algumas empresas e indústrias
ineficientes e seus respectivos empregos são protegidos, mas à custa de todo o
resto da população.
Como bem disse o economista
Walter Williams:
"Os
beneficiários de políticas protecionistas e de políticas de subsídios sempre
são muito visíveis. Já suas vítimas são invisíveis. Os políticos
adoram esse arranjo. E o motivo é simples: os beneficiados sabem em quem
devem votar em agradecimento ao arranjo; já as vítimas não sabem quem culpar
pelo desastre."
Livre comércio significa livre iniciativa. É por meio do livre comércio e das transações
voluntárias que as pessoas buscam saciar seus desejos e necessidades. As pessoas acordam cedo e vão trabalhar
exatamente para ganhar dinheiro e, com isso, poderem consumir o que
quiserem. As pessoas trabalham e
produzem para poder consumir produtos bons e baratos. Impor obstáculos a esse consumo significa
restringir a maneira como as pessoas trabalhadoras podem usufruir os frutos do
seu trabalho. No mínimo, isso é imoral e
anti-humano.
A restrição ao livre comércio é o motivo de as
pessoas em Cuba dirigem carros da década de 1950 e ninguém invejar o padrão de
vida dos norte-coreanos.
Conclusão
São as trocas comerciais voluntárias que elevam o
padrão de vida das pessoas. Quando o
governo impõe restrições e tarifas ao livre comércio, a renda da população cai,
a capacidade de investimento e de consumo diminui, empreendimentos se tornam
menos produtivos e mais ineficientes, e, consequentemente, as pessoas
sofrem.
Sim, alguns empregos são destruídos pela
concorrência estrangeira, mas estes são empregos, por definição,
ineficientes. São empregos em indústrias
que não demonstraram ser tão eficientes quanto as estrangeiras em prover bens
de qualidade e mais baratos. Logo, são
empregos que custam caro à sociedade.
Por causa do aumento da renda e da capacidade de
consumo da população permitido pelas importações, estes empreendimentos ineficientes
serão substituídos por empreendimentos eficientes em outros setores, os quais
criarão agora empregos mais produtivos.
Ao final, todos, até mesmo empregados demitidos por causa da
concorrência estrangeira, ficam em melhor situação.
O livre comércio não tem de ser bilateral. Se outros países impuserem tarifas de
importação aos nossos produtos nacionais, não há justificativa para prejudicar
a população nacional impedindo-a de consumir produtos desses países. Quando compramos importados, ganhamos todos
os benefícios acima descritos. Cortar
esses benefícios apenas para fazer uma guerra comercial -- algo que sempre
excita os políticos -- é algo que não irá em absoluto melhorar a situação da
população brasileira.
Por fim, se há problemas de fundo que afetam a
competitividade de alguns setores nacionais em relação aos estrangeiros -- como
a voraz carga tributária, a enorme burocracia, a alta inflação de preços, as
indecifráveis regulações e os poderosos sindicatos --, isso tem de ser atacado
por meio de reformas estruturais. Se os custos de produção são altos e estão
inviabilizando até mesmo as indústrias eficientes, então isso é problema do
Ministério da Fazenda, do Ministério do Planejamento, da Receita Federal e do
Ministério do Trabalho. São eles que impõem tributos, regulamentações,
burocracias e protegem sindicatos.
Recorrer ao protecionismo para proteger essas
indústrias em detrimento do resto da população é simplesmente criar mais
problemas sobre os problemas já existentes. Tolher os consumidores ou impor
tarifas de importação para compensar a existência de impostos, de burocracia e
de regulamentações sobre as indústrias é jogar gasolina no fogo.
No final, isso irá empobrecer a todos para favorecer
a apenas alguns poucos. E é exatamente isso que os governos de países
pobres fazem.
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Leandro
Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises
Brasil.
Georgi Vuldzhev é
graduando em ciências econômicas e membro do Instituto para a Economia de
Mercado, em Sofia, na Bulgária.
John
Tamny é o editor do site Real Clear Markets e contribui
para a revista Forbes.