Se o governo gasta mais do que arrecada via impostos,
ele está incorrendo em um déficit orçamentário. Para cobrir esse déficit, ele terá
de se endividar. Somente se endividando ele poderá bancar os gastos que excederam
o montante arrecadado via impostos.
No Brasil, nos últimos 12 meses, o déficit orçamentário
total do governo federal foi de R$ 534 bilhões (o que equivale
a nada menos que 8,5% do PIB do Brasil). Isso significa que o governo federal gastou R$ 534 bilhões a mais do que
arrecadou. Consequentemente, isso significa que ele teve de se endividar em
mais R$ 534 bilhões para poder manter seus gastos totais.
E quem emprestou esses R$ 534 bilhões para o governo
federal? Bancos, empresas e pessoas físicas. Isso, por definição, significa que
R$ 534 bilhões que poderiam ter sido utilizados em investimentos produtivos, expansão
de negócios e contratação de mão-de-obra acabaram sendo direcionados para
financiar a máquina estatal.
Portanto, quando o governo incorre em um déficit orçamentário
e se endivida, isso significa que ele
está tomando mais crédito junto ao setor privado. E dado que o governo está
tomando mais crédito, sobrará menos crédito disponível para financiar
empreendimentos produtivos.
Para o governo conseguir
todo este volume de crédito, não há segredo: ele tem de pagar juros altos. Qualquer instituição
que tenha de se endividar o equivalente a 8,50% do PIB em 12 meses terá de pagar
juros altos.
E isso será fatal especialmente
para as micro, pequenas e médias empresas, que agora terão de pagar juros muito
maiores para conseguir empréstimos. Afinal,
se investidores podem emprestar a 12,25% ao ano para o governo, sem risco nenhum,
por que emprestariam ao mesmo valor para empreendedores, que estão mais
propensos às vicissitudes da economia, podendo dar calotes. Obviamente, só emprestarão
a juros muito maiores.
Evolução da dívida
A atual dívida do governo federal está em R$ 4,5 trilhões. Nunca é demais repetir este gráfico, que mostra a evolução dessa dívida:

Evolução da dívida bruta do governo federal
Essa dívida de R$ 4,5 trilhões foi gerada por uma sequência de déficits orçamentários. E os déficits orçamentários foram causados pelo aumento incontrolado dos gastos do governo.
Colocando de outra forma, o descontrole orçamentário do governo federal, causado pelo aumento desbragado dos gastos públicos, gerou seguidos déficits nominais orçamentários, os quais se acumularam em uma dívida total de R$ 4,5 trilhões.
Perceba que, só de 2014 até hoje, o déficit nominal orçamentário do governo foi de R$ 1,50 trilhão. Ou seja, em apenas três anos, o governo federal tomou emprestado R$ 1,50 trilhão de bancos, fundos de investimento, pessoas físicas e empresas para bancar seus crescentes gastos. Nos últimos 12 meses, como dito, a cifra foi de R$ 534 bilhões. Uma pornografia.
Já em 22 anos, durante toda a vida do real, o governo federal já absorveu mais de R$ 4 trilhões de reais em empréstimos. São R$ 4 trilhões que poderiam ter sido utilizados para financiar investimentos e empreendimentos, criar riquezas, abrir novas empresas e gerar milhões de novos empregos, mas que foram sugados pelo governo federal e desperdiçados no sustento da máquina pública e de sua burocracia.
Dinheiro que poderia ter sido emprestado para empresas investirem foi direcionado para financiar os déficits do governo, fazendo com que vários investimentos não fossem concretizados por não serem financeiramente viáveis em decorrência dos juros maiores causados por esses monstruosos déficits do governo.
Podemos apenas imaginar as empresas que não foram abertas, os empregos que não foram gerados e as tecnologias que não foram criadas simplesmente porque os investimentos não foram possíveis por causa da absorção de recursos pelo governo federal.
Igualmente tenebroso é
imaginar todo o custo com os juros altos que as pessoas e empresas tiveram de
suportar por causa desse gigantismo do governo federal.
Por tudo isso, os déficits do governo nos empobrecem.
No entanto, todo esse
raciocínio demonstra algo ainda mais premente: ainda piores do que os déficits são
suas causas: os gastos do governo.
Gastos do governo -- e não os déficits -- são o
real problema
O que realmente importa
para a saúde de uma economia não é o tamanho do déficit do governo, mas sim o
tamanho dos gastos do governo.
Ao contrário do que muitos
imaginam, o que determina o tamanho de um governo não é a carga tributária, mas
sim seu total de gastos. A variável "carga tributária"
engloba, obviamente, apenas os impostos arrecadados. Já a variável
"gastos do governo" engloba os impostos arrecadados pelo governo e mais
o seu endividamento.
De um lado, a tributação
nada mais é do que uma destruição de riquezas. Parte daquilo que o setor
privado produz é confiscado pelo governo e desperdiçado em salários de
políticos, salários de burocratas, obras superfaturadas, agrados a lobistas,
agrados a grupos de interesse e em péssimos serviços públicos. Esse
dinheiro confiscado não é alocado em termos de mercado, isto é, não é alocado
de modo a satisfazer os reais desejos dos consumidores, o que significa que
está havendo uma destruição da riqueza gerada.
Já a emissão de títulos
públicos (endividamento) não apenas gera os problemas acima descritos (redução dos
investimentos produtivos), como também gera o aumento da dívida total do
governo, cujos juros serão pagos ou por meio de mais impostos ou por meio da emissão
de mais títulos (que é o que chamam de "rolar a dívida"). Sim,
é uma bagunça.
Por mais deletérios que
sejam os impostos, eles não conseguem ser piores do que os gastos do governo. Os impostos englobam apenas eles próprios; já os gastos do governo englobam os
impostos e mais o endividamento. É impossível haver gastos sem que pelo
menos um desses dois tenha ocorrido.
E o pior: quando os
gastos aumentam, isso significa que um desses dois inevitavelmente também será
aumentado no futuro. E a hipótese mais plausível é que os dois aumentem
simultaneamente.
E o ainda pior: se os
gastos do governo estiverem crescendo a uma taxa superior à taxa de crescimento
do PIB -- como
ocorre no Brasil --, isso significa que o governo está aumentando sua
participação na economia e, consequentemente, o setor privado está
encolhendo.
Por isso, os gastos do
governo são, sob qualquer aspecto e em qualquer situação, um fardo para toda a
economia de um país.
Mas e os gastos governamentais em investimento?
Ainda assim, há aqueles
que afirmam que há ao menos um tipo de gasto do governo que traz retornos
positivos e aumenta o bem-estar de todos na sociedade: os gastos em investimento.
Por exemplo, se o governo
construir uma ponte, toda a sociedade ganha com isso.
Será?
É indiscutível que a
ponte será ótima para aquela pequena fatia da população que irá utilizá-la diariamente. A
questão é: e quanto ao restante da população? Quais serão as consequências da construção
desta ponte para quem não a utiliza?
A construção da ponte será
paga ou com impostos ou com endividamento.
Se com impostos, as
pessoas e empresas que pagaram esses impostos ficarão sem esse dinheiro e, logo,
não poderão despendê-lo em coisas que voluntariamente considerem mais
necessárias. Consequentemente, os empreendimentos que receberiam esse dinheiro
ficam agora sem receita.
Se com endividamento do
governo, as pessoas e empresas que poderiam ter pegado esse dinheiro emprestado
para fazer investimentos produtivos, ficarão agora sem acesso a ele.
Em ambos os casos, os
empreendimentos que agora não mais receberão este dinheiro -- que foi desviado
para a construção da ponte -- começarão a demitir. Ou então não mais se expandirão.
Portanto, para cada
emprego público criado pelo projeto da ponte, foi destruído, em algum lugar, um
emprego no setor privado.
Podemos ver os operários
empregados na construção da ponte. Podemos vê-los trabalhando. Esta
imagem real faz com que o argumento do governo -- seu investimento gerou
empregos -- se torne vívido, tangível e convincente para a maioria das pessoas.
Há, no entanto, outras coisas que não vemos porque, infelizmente, não se
permitiu que surgissem. São os empregos destruídos pelos $100 milhões
tirados dos contribuintes ou do mercado de crédito.
Na melhor das hipóteses,
tudo o que aconteceu foi uma transferência de empregos por
causa de um projeto. Mais operários para a construção da ponte; menos
operários para a indústria automobilística, menos empregados para fábricas de
artigos de vestuário e para a agropecuária.
E agora vem pior: caso a
obra tenha sido financiada via empréstimos contraídos pelo governo, tais empréstimos
terão de ser quitados. E quem fará isso serão os pagadores de impostos de todo
o país. Dado que o governo não gera riqueza, ele só poderá quitar seus empréstimos
por meio de impostos confiscados da sociedade.
Como então é possível dizer
que houve um enriquecimento de toda a sociedade?
A grande lição é: vivemos
em um mundo de recursos escassos. Aquilo que é utilizado em um setor foi
necessariamente retirado de outro setor. Se os gastos do governo concentraram
recursos em um setor, então outros setores ficaram sem estes mesmos recursos.
Se o governo está
construindo uma ponte, ele irá consumir grandes quantidades de aço, cimento, vergalhões
e argamassa. Isso significa que todo o resto do setor da construção civil terá
agora de pagar mais caro para conseguir a mesma quantidade de aço, cimento, vergalhões,
argamassa. Os preços desses itens irão subir e, como consequência, todos os
bens que utilizam esses itens em sua construção -- como imóveis e carros -- ficarão
mais caros.
Quando o governo gasta,
ele está consumindo bens que, de outra forma, seriam utilizados pela população
ou mesmo por empreendedores para fins mais úteis e mais produtivos. Por
isso, todo o gasto do governo gera um exaurimento de recursos. Bens que
foram poupados para serem consumidos no futuro acabam sendo apropriados pelo
governo, que os utilizará sempre de forma mais irracional que o mercado, que
sempre se preocupa com o sistema de lucros e prejuízos. Portanto, os
gastos do governo exaurem a poupança (por ''poupança'', entenda-se ''bens que
não foram consumidos no presente para serem utilizados em atividades
futuras'').
Os gastos do governo não possuem
o poder milagroso de criar riqueza para todos. Sempre há os que ganham e sempre
há os que perdem. Impossível todos ganharem.
O velho ditado segue
impávido: quem afirma que gastos do governo geram crescimento econômico está
afirmando que tomar dinheiro de uns para gastar com outros pode enriquecer a
todos. Está afirmando que tirar água da parte funda da piscina e jogá-la
na parte rasa fará o nível geral de água na piscina aumentar.
Conclusão
Os déficits orçamentários
do governo são péssimos. Mas seus gastos totais são ainda piores.
Se o objetivo é estimular
o crescimento econômico, então o real objetivo tem de ser a redução dos
gastos do governo, e não apenas "equilibrar o orçamento".
Um orçamento
governamental total de $4 trilhões e um déficit de $500 bilhões representam um
fardo muito maior e muito mais danoso sobre a economia privada do que um
orçamento de $2 trilhões parcialmente financiado por um déficit de $1 trilhão.
Adicionalmente, se o
governo aumenta seus gastos, os próprios estímulos para o empreendimento
privado são reduzidos. Por que você vai abrir uma padaria, um
restaurante, um comércio ou uma atividade de serviços se você pode se tornar um
burocrata bem pago trabalhando em uma repartição pública? Por que uma
pessoa qualificada vai querer fazer algum estágio em uma firma de engenharia se
o governo abriu vários concursos públicos que prometem salários nababescos e
estabilidade no emprego? Enfim, por que se arriscar no setor privado,
sofrendo cobranças e tendo de apresentar eficiência, se você pode simplesmente
ganhar muito no setor público, tendo estabilidade no emprego e sem ter de
apresentar resultados?
Por tudo isso, todo e qualquer déficit orçamentário do governo tem de ser combatido com cortes de gastos, e não com aumentos de impostos.
Se o objetivo é viver em um país dinâmico, não fagocitado pela burocracia e pelos impostos, com níveis toleráveis de endividamento e onde os cidadãos não padeçam dos excessos e esbanjamentos de sua classe política, então é necessário fazer intensa pressão pelo corte de gastos, e jamais tolerar idéias de aumento — ou de criação — de impostos.
No Brasil, por exemplo, a extinção dos super-salários dos sultões do setor público já seria um bom começo. A abolição do BNDES e a devolução do dinheiro a ele emprestado pelo Tesouro também fariam muito pela causa. Os 39 ministérios deixados por Dilma, que custavam mais de R$ 400 bilhões por ano e empregavam 113 mil apadrinhados, e cujos salários consomem R$ 214 bilhões, também são um alvo apetitoso. Não basta apenas fundir um ao outro, e transformar alguns em secretárias. Tem de fechar.
Meirelles vai encarar?
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privados: quando o governo gasta, ganham os grandes e perdem os pequenos
Como uma redução nos gastos
do governo gera crescimento econômico
Gastos governamentais
sempre são ruins para a economia
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Frank
Shostak, scholar
adjunto do Mises Institute e um colaborador frequente do mises.org. Sua empresa de consultoria, a Applied Austrian School Economics, fornece
análises e relatórios detalhados sobre mercados financeiros e as economias
globais.
Leandro
Roque, editor e tradutor do
site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.