A piada mais duradoura sobre o Brasil é a de que ele
é o país do
futuro, e para sempre será. No entanto, se Jair Bolsonaro conseguir colocar
em prática o tom que adotou desde o início de sua presidência, pode ser que não
demore muito para que o futuro se torne o presente.
Oficialmente empossado no início do ano, o governo
Bolsonaro já capturou a atenção internacional. Tendo sido, por anos, retratado
pela mídia ocidental como uma sinistra ameaça
para a democracia brasileira -- embora tenha sido um bem-sucedido candidato
popular, apoiado
por um eleitorado bastante diverso --, esses mesmos veículos midiáticos
foram rápidos em já rotular o novo governo como sendo hostil
aos direitos das minorias.
A grande notícia que merece ser discutida, no
entanto, é o aparente compromisso de Bolsonaro a um tipo de revolução
ideológica de que o Brasil desesperadoramente necessita caso queira ter alguma
chance de prosperar. Embora a história nos ensine que jamais devemos acreditar
que um político irá realmente entregar suas sublimes promessas de liberdade, os
primeiros dias de sua presidência apresentaram medidas merecedoras de elogios.
Para começar, em seu discurso
de posse, Bolsonaro jurou seguir sua promessa de campanha de mudar
dramaticamente um governo assolado pela corrupção e pela crise econômica:
Amigas
e amigos de todo o Brasil, é com humildade e honra que me dirijo a todos
vocês como presidente do Brasil. E me coloco diante de toda a nação, neste
dia, como o dia em que o povo começou a se libertar do socialismo, da inversão
de valores, do gigantismo estatal e do politicamente correto. [...]Essa é a
nossa bandeira, que jamais será vermelha. Só será vermelha se for preciso
sangue para mantê-la verde e amarela.
Em seu Twitter, ele prometeu
"combater o lixo marxista que se instalou nas instituições de ensino".
O que é animador é que Bolsonaro está percebendo que
o verdadeiro inimigo de sua administração não é simplesmente um político rival
ou uma série de más políticas que têm de ser reformadas, mas sim a ideologia
socialista que causou tanta miséria e sofrimento ao redor do mundo e,
particularmente, na América
Latina. Identificar corretamente o problema subjacente é a melhor maneira
de descobrir uma solução.
Isso se alinha com a visão de Ludwig von Mises sobre
a importância das idéias para uma sociedade. Mises escreveu extensivamente
sobre como o fator supremo e decisivo para o sucesso ou o fracasso de uma
civilização tem menos a ver com os políticos e com as instituições criadas, mas
sim com as idéias fundamentais que os guiam. Como ele escreveu em As Seis Lições:
Tudo
o que ocorre na sociedade de nossos dias é fruto de ideias, sejam elas boas,
sejam elas más. Faz-se necessário combater as más ideias. Devemos
lutar contra tudo o que não é bom na vida pública. Devemos substituir as
ideias errôneas por outras melhores. ... Ideias, e somente ideias, podem
iluminar a escuridão.
É óbvio que uma verdadeira revolução ideológica
requer muito mais do que apenas retórica política e discursos arrebatadores. Logo,
a questão é como ele conseguirá implantar políticas pró-mercado que irão
realmente permitir que o Brasil seja bem-sucedido.
Felizmente, o que a maioria da mídia ocidental vem
ignorando por completo é que a ascensão de Bolsonaro não pode ser resumida a
políticas populistas implantadas por governantes antigos e que descambaram em
corrupção e recessão. Isso explica uma parte, mas não o todo. A verdade é que o
Brasil vivenciou uma impressionante ascensão de institutos
liberais/libertários, bem como de estudiosos libertários infiltrados na classe
intelectual, os quais ajudaram a difundir de maneira impressionantemente rápida
as idéias da liberdade e do bom senso econômico.
Graças a organizações como Instituto Mises Brasil, Instituto Liberal, Instituto Rothbard, Spotniks, Estudantes
pela Liberdade, Bunker Libertário,
Academia Liberalismo Econômico e
várias outras, as obras de grandes pensadores como Mises, Murray Rothbard,
Frédéric Bastiat, F.A. Hayek e outros foram traduzidas e espalhadas pelo país.
O presidente Bolsonaro já
foi fotografado com cópias em português de A Lei, de
Bastiat, e As Seis Lições, de
Mises.
Isso é importante não só porque ressalta o
crescimento destas idéias para além das lentes estreitas da política, mas
também porque mostra que Bolsonaro tem acesso a excelentes idéias que pode
implantar em sua administração. Nas palavras do presidente do Instituto Mises
Brasil, Helio Beltrão, o novo presidente montou "um time excelente formado por
técnicos com nobres intenções".
Estudiosos filiados a várias organizações libertárias
e pró-livre mercado -- como o próprio Instituto Mises -- foram nomeados para
posições dentro da administração, o que inclui Bruno
Garschagen, anfitrião do podcast
do Instituto. O novo Ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, já foi
entrevistado duas vezes por Garschagen em seu podcast (ver aqui e aqui), bem como Adolfo
Sachsida (ver aqui e aqui), que será Secretário
de Política Econômica da Fazenda. (Veja aqui um debate
entre Sachsida e o editor do Mises Brasil, Leandro Roque, sobre a Reforma da
Previdência).
Naturalmente, ao assumir uma enorme burocracia
estatal que estava há décadas sob controle socialista, a remoção de agentes
nefastos encastelados no aparato é tão importante quanto a atração de novos
talentos. Ao passo que Donald Trump popularizou o então obscuro termo "Estado
Profundo" (Deep State),
sua administração não se mostrou capaz de "drenar o pântano" (Drain
the Swamp) e acabar com o reinado dos políticos profissionais e dos
burocratas lotados na máquina estatal, como ele havia prometido. Esta é outra
área em que a administração Bolsonaro está aparentando maior vigor.
No dia 3 de janeiro, o chefe da Casa Civil Onyx
Lorenzoni anunciou
que o governo iria exonerar dos cargos públicos todos
os funcionários simpáticos a idéias socialistas. Embora as manchetes dos
jornais, principalmente estrangeiros, tenham vindo recheadas de notícia como
"expurgos comunistas" comandados por um "líder de direita latino-americano",
com o claro intuito de evocar imagens das políticas sanguinolentas de Augusto
Pinochet e Jorge Videla, a verdade é que demitir burocratas dificilmente pode
ser comparável a "esquadrões da morte direitistas".
É claro que uma das melhores maneiras de implantar a
visão anti-marxista de Bolsonaro seria simplesmente deixar vagos todos esses
cargos exonerados como parte de uma redução generalizada do governo brasileiro.
Com alguma sorte, o governo também irá prestar atenção ao plano de
desburocratização da economia sugerido por Helio Beltrão.
Outro sinal promissor oriundo de Lorenzoni é que ele
instruiu
todos os ministros do governo a inventariar as propriedades sob seu controle
para identificar quais poderiam ser vendidas. A esperança é que o governo
Bolsonaro irá cumprir a declaração de Paulo Guedes, o novo Ministro da Economia,
de "privatizar tudo o que
for possível". Não apenas essas vendas irão ajudar a reduzir a dívida do
país (atualmente em mais de R$ 6,2 trilhões, o
equivalente a 81% do PIB), mas também irão permitir que ativos e empresas
possam operar mais eficientemente ao estarem livres do estrangulamento do
planejamento central do governo.
Embora haja muitos sinais de otimismo nestes primeiros
dias do governo Bolsonaro, seria loucura ignorar os desafios que ainda
atormentam o país. Como
explicou Leandro Roque, há quatro nós que precisam ser desatados, sendo o
principal os crescentes custos da Previdência Social em conjunto com uma
população que está envelhecendo. Será que um político popular estará disposto a
implantar as inevitavelmente dolorosas reformas que envolvem cortes de gastos e
de "direitos adquiridos", bem como elevação da idade mínima? A conferir.
Igualmente, seria também um erro confundir retórica
anti-marxista com uma genuína defesa da liberdade e do livre mercado. A própria
história dos EUA já mostrou como alguns dos mais vocais oponentes do comunismo
foram também aqueles que implantaram algumas
das piores políticas domésticas. Será o time de liberais clássicos de
Bolsonaro capaz de resistir às pressões populares? A alternativa é se tornar
mais uma decepção como vários outros antecessores.
Só o tempo dirá.
No final, o que é realmente estimulante é ver a
ascensão de um político popular disposto a utilizar sua plataforma para
abertamente denunciar os perigos da ideologia marxista. Se o Brasil for capaz
de manter sua trajetória de Menos Marx, Mais Mises,
então o país irá finalmente ser capaz de viver à altura de seu antigo e
amplamente reconhecido potencial.