"Viveram pouco para morrer bem
Morreram jovens para viver sempre."
Este verso encontra-se na base do Obelisco do Parque do
Ibirapuera, o maior monumento de São Paulo, construído em homenagem à Revolução de 9 de julho de 1932. Ele é um mausoléu onde estão os restos mortais
dos estudantes Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo — o MMDC — e de mais 713
combatentes que morreram durante os conflitos. Mas o monumento não é grande o suficiente,
pois junto com estes homens, morreu o espírito de liberdade de todas as
gerações posteriores: o poder de um governo central nunca mais foi enfrentado.
Um dos objetivos dos revolucionários era a proclamação de
uma nova Constituição para o Brasil, que devolvesse ao estado de São Paulo
poderes usurpados pela ditadura de Getúlio Vargas — por isso ela também é
chamada de Revolução Constitucionalista.
Mas entre os líderes do movimento havia os separatistas, lutando pela
independência total de São Paulo.
O separatismo, que sempre foi muito forte por toda a
história de São Paulo, foi representado durante a Revolução de 1932 por
escritores como Mario de Andrade, que declarou que naquele momento "faria tudo,
daria tudo para São Paulo se separar do Brasil", e Monteiro Lobato, que afirmou
que o constitucionalismo era apenas um disfarce para o separatismo:
Após a vitória de São Paulo, na
campanha ora empenhada, se faz mister que seus dirigentes não se deixem embalar
pelas ideias sentimentais de brasilidade, irmandade e outras sonoridades.[...]
Ou São Paulo desarma a União e arma-se a si próprio, de modo a dirigir
doravante a política nacional a seu talento e em seu proveito, ou
separa-se.[...] Trata-se de uma guerra de independência disfarçada em guerra
constitucionalista.
De fato, a história de São Paulo é repleta de levantes por
mais autonomia, o primeiro deles ocorrendo em 1641, quando o fazendeiro Amador
Bueno foi aclamado Rei de São Paulo, que pretendia se tornar independente da
Coroa Portuguesa. Os motivos dos
separatistas podiam não ser os mais nobres[1],
mas a causa separatista é sempre bem vinda, e o proeminente historiador inglês
Robert Southey (1774 – 1843) chegou a declarar que "se a aclamação (separação)
tivesse ocorrido, os paulistas seriam o povo mais formidável das
Américas."
Depois deste, muitos outros conflitos ocorreram, nem todos
de cunho separatista, desde a Revolução Liberal de 1842, até a Greve Geral
Anarquista de 1917, mostrando uma tradição paulista de não aceitar passivamente
os desmandos do poder central. E esta
não é uma característica exclusiva de São Paulo, pois ocorreram muitas revoltas
separatistas em diversos outros estados, como a Inconfidência Mineira, a
Revolução Farroupilha, a Guerra do Contestado, a Conjuração Baiana, a Sabinada,
a Confederação do Equador, a Revolução Pernambucana, a Revolução Praieira e
muitas outras. De todos os movimentos,
apenas dois obtiveram sucesso em sua secessão: o Grito do Ipiranga, que marcou
a Independência do Brasil de Portugal, e a Guerra da Cisplatina, que separou o
Uruguai do Brasil.
Por estes dois exemplos, podemos ver que secessão não é
nenhuma panaceia. O Brasil continua sob
quase todos os aspectos pior do que Portugal, e o Uruguai não é nenhuma Suíça
— mas podemos imaginar como o Uruguai estaria se, além de todos os seus
problemas, ainda tivesse de ajudar a sustentar Brasília; e se todo o Brasil
tivesse de, além de sustentar Brasília, ainda pagar impostos para Lisboa.
Gary North apontou em controverso artigo publicado neste
site na semana passada que a Revolução Americana que separou os Estados Unidos
da Grã Bretanha prejudicou em muito a liberdade, pois quando os EUA eram parte
do império, recaia sobre os colonos um imposto de apenas 1% e eles gozavam de
um dos ambientes de maior liberdade do mundo. Porém, já no eclodir da Revolução, os
revolucionários inflacionaram a moeda, impuseram um controle de preços e, após
a Revolução, a carga tributária havia triplicado — e nunca mais parou de
subir.
Enquanto os revolucionários americanos destruíram o sistema
monetário imprimindo desenfreadamente o Continental, os revolucionários
paulistas de 9 de julho criaram uma moeda própria lastreada em ouro, o que deu
indícios de que a consolidação da secessão iria dar início a uma região
autônoma muito mais livre.
Conquanto as secessões de Brasil e Estados Unidos não tenham
representado por si sós avanços na liberdade, elas careceram de um elemento específico
que consiste na maior vantagem do separatismo: ambas formaram estados de
proporções continentais. Em uma
espetacular palestra sobre as
vantagens de estados pequenos e os perigos da centralização, Hans-Hermann
Hoppe explica que estados pequenos devem necessariamente adotar políticas de
livre mercado. Países como Andorra e
Liechtenstein não iriam sobreviver se impusessem protecionismo, ao passo que um
país com as dimensões dos EUA consegue produzir praticamente tudo internamente
e, embora fosse empobrecer demasiadamente, poderia suportar enormes barreiras
de importações. Países pequenos também
tendem a adotar menos regulamentações e impostos mais baixos, pois competem com
outros estados pelos seus súditos, e as pessoas simplesmente se mudam de
vizinhança (estado) caso este se torne opressor. Logo, a esperança para a liberdade
seria um mundo formado por milhares de Andorras, Mônacos, Liechtensteins, Hong
Kongs, Cingapuras etc.
Além dos políticos que controlam territórios gigantescos e
se tornam multibilionários por conta disso, acho que um mundo com estas
configurações seria uma desvantagem apenas para entidades desportivas e seus
campeonatos mundiais entre países. Para
a FIFA, por exemplo, organizar uma Copa do Mundo entre dezenas ou centenas de
milhares de micro-países seria talvez inviável e nada atrativo. No entanto, poderia levar um pouco mais de
"justiça", já que faria mais sentido o Uruguai enfrentar a seleção do Rio Grande
do Sul, ou a Espanha enfrentar a seleção de Minas Gerais, do que o enorme
Brasil. Mas a própria Espanha possui
fortes movimentos separatistas, e quando sua seleção foi campeã do mundo,
diversas bandeiras das regiões que lutam por independência entraram em campo na
comemoração, erguidas pelos jogadores das específicas localidades. Nacionalistas
catalães, galegos e bascos ignoram a seleção espanhola.
Mas por que falar de futebol no meio de um texto sobre
revoluções separatistas? Não está
desviando demais do assunto? Na verdade,
não. O Brasil não passa de uma abstração
e o futebol, que antes era considerado um estrangeirismo, é um dos elementos
que compõem a identidade nacional, a qual era inexistente antes de 1930, como
nos mostra o historiador revisionista libertário Leandro Narloch em seu best
seller Guia politicamente incorreto da
história do Brasil. O samba, a feijoada,
a capoeira, o futebol, o mulato etc. foram artificialmente elevados a itens de
uma cultura brasileira. E para quê? Para ajudarem a fortalecer um governo
altamente centralizado, já que o que segura esta enorme entidade política unida
é tão somente a opinião popular. E se as
pessoas das diferentes e longínquas regiões não se identificarem culturalmente
umas com as outras, a união não tem como se manter. Destruir diferenças regionais através do
multiculturalismo também ajuda a manter um poder central no comando de um
grande território.
É realmente surpreendente o fato de os brasileiros dos
diferentes estados concordarem com a união e o comando central de Brasília. Apesar de todo autoritarismo do governo
federal, é certo que alguns estados levam suas vantagens neste arranjo
político, como mostra o
redistributivismo entre os estados; mas e
quanto aos brasileiros dos estados que só obtêm desvantagens, como eles aturam
isto? O que aconteceu com o espírito
revolucionário que foi tão presente na história? Por que continuam sendo
súditos de um presidente que sequer escolheram? Este
mapa mostra que a pessoa que ocupa a presidência atualmente foi a vitoriosa
nas eleições em apenas parte dos estados.

Eleições já são uma grande farsa que não legitimam a
autoridade de ninguém, e mesmo um vitorioso com 90% dos votos sequer foi o
escolhido pelos que votaram no outro candidato e pelos que nem votaram. Mas um mapa com esta coloração já não é
motivo suficiente para se separar a parte azul da vermelha, cada uma ficando
com seu presidente? Este vídeo mostra como a atual presidente é extremamente
rejeitada mesmo no Rio de Janeiro, estado em que ela foi a vitoriosa com 60%
dos votos:
E, logicamente, o mais sensato seria que cada um dos estados
tivesse como seu presidente o respectivo governador eleito; e, prosseguindo com
a lógica secessionista, ela só iria encontrar limites no indivíduo, como notou Ludwig von Mises. Mas se alcançássemos
um território formado por milhares de cidades-estados como vislumbrado por
Hoppe, um ambiente propício para a liberdade e o consequente progresso e
enriquecimento geral iria vigorar.
A revolta contra o poder que foi revelada durante a recente
onda de protestos parece estar generalizada, e o sentimento separatista esboça
um ressurgimento. O professor Antony Mueller traçou um paralelo da atual
presidente como uma espécie de Maria Antonieta, ao comparar os gastos
extravagantes das duas cortes. Apenas para citar um exemplo, a rainha atual
levou uma comitiva para Roma para a posse do novo Papa que ocupou 52
quartos num hotel de luxo, tudo pago pelos trabalhadores brasileiros que
são obrigados a força da bala a sustentar essa opulência. Quanto mais tempo o povo terá que suportar
tudo isso até que um governador proclame a independência de seu estado? Sustentar Brasília pra quê?
[1]
Uma das motivações dos separatistas foi continuar com a prática de escravizar
índios, proibida pela Bula Papal de 1640, que excomungava todos que
escravizassem índios (o que fez com que os paulistas expulsassem os jesuítas de
São Paulo). E, além disso, a Coroa
Portuguesa possuía interesses comerciais no tráfico negreiro. Mas os separatistas também objetivavam a
manutenção do livre comércio com o Paraguai, também ameaçado pela Coroa
Portuguesa.