1. INTRODUÇÃO
Este artigo tratará de
um verdadeiro gigante, um economista pouco estudado nos cursos de História do
Pensamento Econômico, mas para muitos considerado não apenas um importante
protoaustríaco, mas o verdadeiro fundador da Ciência Econômica, honraria quase
sempre associada ao nome (não menor) de Adam Smith.
Foi o primeiro a
publicar um tratado em que apresentava a economia em bases organizadas e
científicas, o Essai sur la nature du
commerce en général, escrito por volta de 1730 e publicado em França em
1755 e, portanto, cerca de 46 anos antes de
Riqueza das Nações, de 1776.
O economista brasileiro Domingos
Crosseti Branda, em artigo publicado em 24 de março de 2011, sob o título O pai fundador da economia
moderna, escreve:
A sistemática de exposição [metodológica] de ideias e seu enfoque emancipado da
política e da ética demarcaram um campo independente de investigação — a
economia —, o que caracterizava Cantillon como um tipo de pensador diferente
dos escolásticos medievais. Centrava
sua análise econômica na ação humana e a abstraia de outras dimensões,
procedimento que Mises caracterizaria mais tarde como "método Gedanken", assim podendo analisar as
relações de causa e efeito existentes na vida econômica. Desse modo ele
desenvolveu sucessivas aproximações e abstrações e explicar questões
fundamentais da teoria econômica, como a do valor e preço, a da atividade
empresarial, a da moeda e a da auto-regulação do mercado, entre outras questões.
O Professor Mark
Thornton inicia o capítulo 2 do livro "The Great
Austrian Economists", editado por Randall G. Holcombe (Ludwig von Mises
Institute, 1999, iBooks), com a seguinte consideração;
Muitas das percepções austríacas foram estabelecidas na
economia pelo banqueiro irlandês Richard Cantillon (168? — 1734) e sua
publicação solitária, Essai sur la
Nature du Commerce en Général. Parece claro que Cantillon foi
uma importante influência sobre o desenvolvimento da economia austríaca, e que
ele pode ser considerado um membro da Escola Austríaca. Carl Menger tinha uma
cópia do Essai em sua biblioteca antes da publicação dos Princípios de Economia
Política.
Na verdade, as origens da própria teoria econômica podem ser atribuídas a
Cantillon . William Stanley Jevons, um dos co-fundadores da revolução
marginalista, e o economista que geralmente é creditado como o redescobridor de
Cantillon, classificou o Essai como "um tratado sistemático e conectado, cobrindo,
de uma forma concisa, quase todo o campo da economia. . . . É, portanto, o
primeiro tratado sobre a economia". Ele chamou o trabalho de "berço
da Economia Política". Joseph
Schumpeter, o grande historiador do pensamento econômico e estudante de Eugen
von Böhm-Bawerk, descreveu o Essai como "a primeira penetração sistemática
do campo da economia", e Murray N. Rothbard, em seu tratado sobre a
história do pensamento econômico, chama Cantillon de "o pai fundador da
economia moderna" e chega a tratar deselegantemente Adam Smith como um
"plagiador" de Cantillon.
E o Professor Thornton
prossegue lembrando que o episódio de maior relevância na vida de Cantillon foi
o seu envolvimento com John Law
(1671—1729) e seus famosos esquemas monetários. Cantillon se opunha às teorias
inflacionistas de Law, mas entendia como os esquemas funcionavam no mundo real
e quais as suas falhas. Assim, ele foi capaz de criar uma grande fortuna a
partir do Sistema de Mississippi e da famosa bolha de South Sea.
Durante o pesadelo e no
rescaldo daqueles desastres financeiros, Cantillon escreveu seu famoso Essai, emancipando-se do pesadelo
mercantilista predominante naqueles dias para fazer uma contribuição pioneira
para o nosso conhecimento do método, teoria e política. Pouco depois de
escrever o Essai, Cantillon foi
assassinado em condições misteriosas e seu Essai
permaneceu completamente desconhecido por mais de duas décadas.
É interessante notarmos
que seu livro influenciou o desenvolvimento tanto dos fisiocratas quanto dos
economistas clássicos, a ponto de ser um dos poucos autores mencionados por
Adam Smith na Riqueza das Nações. No
entanto, o escocês, que ficou com os louros de fundador da Ciência Econômica,
teria deturpado as ideias de Cantillon, o que fez que este ficasse quase que
esquecido durante o apogeu da economia clássica. O resgate da importância de
sua obra deve-se aos franceses Turgot e Say, dois importantes precursores da
moderna Escola Austríaca, bem como a John Stuart Mill, este já no apagar das luzes
do século XIX.
Graças a Mill, quando da
chamada Revolução Marginalista, ocorreu uma redescoberta de Cantillon e de
muitas de suas proposições. Como escreveu Rothbard no capítulo 12 de seu
tratado Economic
Thought Before Adam Smith [páginas 343-62], "o filósofo escocês e
'cobrador de impostos' Adam Smith não deve ser considerado o pai da economia,
pois esse título deve pertencer ao empresário irlandês e economista austríaco
Richard Cantillon".
Controvérsias à parte,é
indiscutível que Cantillon foi um economista e homem de negócios brilhante, que
antecipou em dois séculos muitos insights
austríacos, bem como algumas proposições de Milton Friedman, da Escola de
Chicago, especialmente no que diz respeito aos efeitos diferentes que variações
na oferta monetária provocam na economia no curto e no longo prazo.
2. BIOGRAFIA
Não há muitos pormenores
sobre a vida de Richard Cantillon, mas sabe-se que ele nasceu durante a década
de 1680, no Condado de Kerry, na Irlanda, filho de um proprietário de terras.
Na primeira década do século XVIII, mudou-se para a França e obteve cidadania
francesa. Em 1711, servindo ao governo da Espanha, organizou pagamentos para os
prisioneiros de guerra britânicos durante a Guerra de Secessão Espanhola.
Permanecendo na Espanha até 1714, estabeleceu um grande número de conexões
empresariais e políticas, antes de retornar a Paris, onde passou a se envolver
com a indústria bancária, trabalhando para um primo, que na época era um
correspondente do ramo parisiense de um banco familiar.
Dois anos mais tarde,
graças ao apoio financeiro de James Brydges, comprou a parte de seu primo e
obteve a propriedade do banco. Dadas as conexões financeiras e políticas que
foi capaz de obter através de sua família e de James Brydges, e principalmente
a seus talentos, revelou-se um banqueiro de sucesso, especializando-se em
transferências de dinheiro entre Paris e Londres.
Cantillon associou-se então com o
mercantilista escocês John Law (1671-1729) que, com base na teoria monetária de
William Potter em seu tratado de 1650, The Key of Wealth — no qual o
economista inglês refutou a validade das teorias metalistas, propondo usar como
moeda títulos de dívida emitidos por uma empresa de comerciantes e garantidos
por imóveis — afirmou que os aumentos da oferta de moeda levariam ao emprego
de terra e trabalho não utilizados, elevando a produtividade.
Em 1716, o governo francês deu-lhe permissão
para fundar o Banque Générale e um monopólio virtual sobre o direito de
desenvolver territórios franceses na América do Norte, criando-se então a Mississippi
Company, com a promessa de Law de que financiaria a dívida do governo
francês a baixas taxas de juros. Law criou, então, uma bolha financeira
especulativa ao vender ações da Mississippi Company, usando o monopólio
virtual do Banque Générale para emitir notas bancárias para financiar
seus investidores.
Richard Cantillon
acumulou uma grande fortuna a partir de sua especulação, comprando a preços
baixíssimos as ações da Mississippi Company no início e as vendendo a
preços bem maiores posteriormente. O sucesso financeiro e a influência
crescente de Cantillon causaram atrito em seu relacionamento com John Law e
algum tempo depois Law teria ameaçado prender Cantillon se ele não deixasse a
França dentro de vinte e quatro horas. Cantillon respondeu: "Eu não vou
embora, mas vou fazer seu sistema ter sucesso". Ao final, em 1718, Law,
Cantillon e o rico especulador Joseph Gage fundaram uma companhia privada para
financiar a especulação de imóveis da América do Norte.
Em 1719, Cantillon
deixou Paris e foi para Amesterdam, retornando brevemente no começo de 1720.
Realizando empréstimos em Paris, Cantillon tinha dívidas sendo quitadas em
Londres e Amsterdam. Com o colapso da "bolha de Mississippi",
Cantillon foi capaz de exigir altas taxas de juros. A maior parte de seus
devedores tinham sofrido prejuízos financeiros no colapso da bolha e culpavam
Cantillon, que se envolveu em inúmeros processos movidos por seus devedores, provocando
um grande número de planos de
assassinatos e acusações criminais.
Em 16 de fevereiro de
1722, Cantillon casou-se com Mary Mahony, filha do Conde Daniel O'Mahony — um
rico mercador e ex-general irlandês — passando grande parte do restante da
década de 1720 viajando pela Europa com sua esposa. Embora ele frequentemente
retornasse a Paris entre 1729 e 1733, sua residência permanente era em Londres. Em maio de
1734, sua casa em Londres sofreu um incêndio devastador, e presume-se que
Cantillon tenha morrido no fogo. Apesar das causas do incêndio serem
desconhecidas, a teoria mais aceita é a de que Cantillon foi assassinado.
Uma outra hipótese
levantada por alguns historiadores é que Cantillon teria forjado sua própria
morte para escapar do assédio de seus devedores, ressurgindo posteriormente no
Suriname com o nome de Chevalier de Louvigny. Como vemos, uma biografia rica e
cheia de peripécias e emoções fortes, entre as quais a de que, em certa
ocasião, Cantillon teria feito uma oferta para comprar a Polônia, que foi
rejeitada.
3. A TEORIA ECONÔMICA DE CANTILLON
Em outro artigo, Cantillon on the cause
of business cycle, o mesmo Thornton enfatiza que Cantillon foi o
primeiro economista a examinar com sucesso a natureza cíclica da economia
capitalista. Vivendo em um tempo (início do século XVIII) em que as
instituições da economia capitalista moderna foram estabelecidas e os primeiros
grandes ciclos de negócios ocorreram, ele foi o primeiro a identificar suas
causas e seus efeitos com singular originalidade. Em contraste com os
mercantilistas, Cantillon era um observador astuto que desenvolveu uma
compreensão econômica clara sobre moeda, bancos, comércio internacional e
mercados de ações, mercados em que arriscou seu capital e fez sua fortuna.
Cantillon foi o primeiro
a modelar a economia como um todo interligado e a desenvolver o que hoje conhecemos
como o modelo do "fluxo circular da riqueza", assim como o mecanismo de preços
que regem os fluxos internacionais de
moeda. Ele percebeu que os mercados eram regulados pelos movimentos de preços
com base na oferta e demanda e identificou tendências equilibradoras mediante
as trocas voluntárias nos mercados.
Observemos que o gráfico
do "fluxo secular da riqueza" de Cantillon, a seguir mostrado, é bem mais rico
em pormenores e em realismo do que o apresentado comumente nos livros-texto de
Economia.

De fato, o Essai apresenta uma metodologia causal distintiva, separando
Cantillon de seus antecessores mercantilistas e é uma obra em que a palavra
"natural" é constantemente usada, tentando implicar uma relação de
causa e efeito entre as ações econômicas e os fenômenos reais.
Murray Rothbard credita
Cantillon como sendo um dos primeiros teóricos a isolar o fenômeno econômico
com modelos simples, onde outras variáveis incontroláveis podem ser fixadas.
Jörg Guido Hülsmann compara alguns dos modelos apresentados no Essai, que trabalha com a hipótese de um
equilíbrio constante, ao conceito de Ludwig von Mises de "economia uniformemente
circular" ("evenly rotating economy").
Cantillon faz uso
frequente do conceito de coeteris paribus
no Essai, em uma tentativa de
neutralizar variáveis independentes, na linha seguida quase duzentos anos
depois por Alfred Marshall. Além disso,
ele é creditado pelo emprego de uma metodologia semelhante ao individualismo
metodológico de Carl Menger, ao deduzir fenômenos bastante complexos a partir
de simples observações individuais.
Cantillon enxergava a
economia como um sistema organizado de mercados interligados que operam no
sentido de chegar a um equilíbrio. As instituições deste sistema organizado
evoluiriam ao longo do tempo em resposta às necessidades, que por sua vez ligam
todos os habitantes de uma sociedade em "uma rede de reciprocidade". O sistema é mantido em ajuste pelo livre jogo
dos auto-interesses, e a economia funciona mediante a ação de uma classe de
empresários que realizam todas as trocas e a circulação do estado.
Cantillon tinha
convicção de que um sistema de mercado funciona melhor sem a interferência do
governo. Os empresários, assim como outros participantes do mercado, estão
vinculados em reciprocidade, uma vez que na realidade são consumidores e clientes
um em relação ao outro. Seu número é,
portanto, regulado pelo número de clientes, ou a demanda total e suas decisões
são tomadas em condições de incerteza sobre o futuro.
Atividade empresarial
A segunda metade da
primeira parte do Essai é onde
Cantillon torna-se o primeiro economista a desenvolver as idéias austríacas
sobre o empreendedor e seu papel na economia. O empreendedor para ele é o
tomador dos riscos causados pelas mudanças na
demanda do mercado. Este é um reflexo direto do próprio início da carreira de
Cantillon como assistente de tesoureiro durante a Guerra da Sucessão Espanhola.
Lá, ele aprendeu e se destacou no papel de contador e negociador de contratos,
e aprendeu o básico do sistema bancário e financeiro internacional.
Na segunda parte do Essai, Cantillon expôs sua análise
austríaca pioneira da economia monetária, expondo o grande erro do mercantilismo
— a falsa ideia de que o dinheiro é riqueza.
Na parte três, Cantillon aborda as questões de comércio exterior e taxas de
câmbio, bem como o papel dos bancos. Nesta parte, Cantillon faz algumas de suas
mais importantes contribuições para a compreensão da economia. Esta seção é uma
crítica das políticas mercantilistas e das inovações financeiras de John Law nas
bolhas do Sistema de Mississippi e da South Sea. Isto é um reflexo do terceiro
período na carreira de Cantillon, durante o qual ele fez fortuna através da
compreensão do sistema financeiro e suas consequências inevitáveis.
De 1721 até sua morte em
1734, Cantillon, como vimos, foi envolvido em disputas legais. Ele estava
envolvido com diversos processos envolvendo seus negócios bancários e a South
Sea Bubble. Foi também acusado de tentativa de homicídio e preso duas vezes,
embora por pouco tempo. É importante atentarmos para o fato de que o Essai foi escrito neste momento e há indícios
para suspeitar que Cantillon tenha desenvolvido sua teoria econômica como parte
de sua defesa legal contra as acusações de usura.
O papel do empresário é
uma das grandes contribuições de Cantillon à teoria econômica. Ele fala do
empresário, no sentido clássico do agente de grandes aventureiros de negócios,
mas também faz uma distinção teórica entre aqueles que trabalham para um
retorno fixo ou salário e aqueles que enfrentam os retornos incertos, incluindo
os agricultores independentes, artesãos, comerciantes e fabricantes. Esses
empresários compram insumos a um determinado preço para produzir e vender mais
tarde a um preço incerto. Em busca do lucro, o empresário deve suportar os
riscos que ele enfrenta com a incerteza generalizada do mercado.
Sobre as origens da teoria econômica
Cantillon envolveu-se de corpo e alma nos acontecimentos cruciais de sua época
e conheceu muitos grandes intelectuais, incluindo vários escritores
mercantilistas importantes. Por essa razão, não escapou completamente da
mentalidade mercantilista então em moda, mas é realmente incrível como ele
claramente rompeu com esse passado por conta própria, para produzir o primeiro
trabalho coerente e abrangente de teoria econômica.
As contribuições de
Cantillon ao método da economia, enquanto não apreciadas em seu tempo e em
grande parte esquecidas, são verdadeiramente notáveis quando colocadas no
contexto histórico. O que impressionou economistas importantes, como Jevons,
Schumpeter, Hayek e Rothbard foi a abordagem científica de Cantillon e a
teorização lógico-dedutiva, tão característica da Escola Austríaca e da
revolução marginal. Ao longo do Essai,
Cantillon está permanentemente preocupado com o fornecimento de explicações
científicas para os fenômenos econômicos. Suas investigações mostram sempre
preocupação com o estabelecimento de causas e efeitos. Cantillon, como já
escrevemos, muitas vezes expressa a relação causal com o termo "natural",
que ele usou trinta vezes no Essai e
que foi utilizada com o mesmo significado por Knut Wicksell no século XX.
Outra característica
marcante de sua análise austríaca é a sua intenção de limitar-se à economia
positiva de cada tema, um atributo que Hayek considerou especialmente notável
para um economista de sua época.
Cantillon também emprega
o método de abstração ou construção imaginária para teorizar sobre a economia.
Ele usa a cláusula coeteris paribus,
por exemplo, quando se discute a produtividade do trabalho: "Quanto mais trabalho é gasto nela (terra), outras coisas sendo iguais, mais ela produz".
Ele usa a ferramenta
teórica do país pequeno e isolado, como os teóricos modernos da Economia
Internacional fazem para eliminar fatores complicadores, tais como distúrbios
monetários e comércio internacional. Mais importante, ele usou esta construção
ou modelo para deduzir o ponto central austríaco de que a produção depende da
demanda, neste caso, a demanda do proprietário da grande propriedade. Além
disso, como o proprietário contrata a produção de suas terras aos agricultores,
ele "cria" empresários e uma economia se desenvolve com a troca, os preços, o
dinheiro e a competição.
Cantillon tem uma
compreensão sofisticada do sistema de preços e sua análise contém a maioria dos
elementos da análise austríaca moderna. O preço é determinado pela demanda e
escassez relativa. A demanda é um conceito subjetivo com base nos "humores"
e "fantasias" do povo. É o "consentimento do povo",
juntamente com a relativa escassez de um produto, o que determina o preço de
mercado, entendendo-se por preço de mercado o preço pago ao vendedor. Do mesmo
modo, o valor dos metais no mercado "varia de acordo com a sua escassez ou
abundância ou de acordo com a demanda."
Cantillon faz uma
distinção importante entre 'preço' e 'preço de mercado' e entre 'valor' e 'valor
de mercado', que tem servido como fonte de confusão sobre o significado de sua
economia. Preço de mercado e valor de
mercado são os preços reais que ocorrem no mercado com base em forças de oferta
e demanda. Preço e valor são conceitos distintos e separados de preços de
mercado. Eles estão relacionados com o que ele chamou de "valor
intrínseco", e são usados para descrever o custo
de oportunidade dos recursos utilizados para produzir o bem particular em
questão, a terra e o trabalho específico que foram sacrificados para produzir o
bem.
Custos de oportunidade
Como observou Hayek, [Richard Cantillon, Journal of Libertarian Studies 7, n 2, outono de 1985, p. 263], o
aspecto mais importante no Essai no
campo do valor e teoria dos preços é a sua busca por regras e fórmulas que
podem explicar a relação "normal" entre o valor ou o preço de vários
bens, concentrando-se nas forças e mecanismos consistentes em restaurar a
normalidade destas relações.
Mais importante ainda
foi Cantillon nomear e descrever um conceito para o qual não exista um termo no
mundo porque Cantillon dominava diversas línguas fluentemente. Sua concepção de
custo como o sacrifício de terra e trabalho é muito mais avançada do que a
teoria da terra e do valor dos fisiocratas, ou a teoria do custo e do
valor-trabalho dos economistas clássicos, entre eles, claramente, Adam Smith.
Mas Cantillon tinha uma compreensão muito mais rica de custos do que uma
simples medida da quantidade de terra e trabalho que entram em produção.
Cantillon ressaltou dois
conceitos importantes no Essai que fornecem
maior profundidade à sua concepção de custo. Primeiro, ele via todos os
recursos como heterogêneos. Cada pedaço de terra era de uma qualidade
diferente, e cada trabalhador também de uma qualidade diferente. Ou seja,
antecipou elementos importantes da Teoria do Capital Austríaca esboçada por
Menger e desenvolvida por Böhm-Bawerk. Por isso, enquanto o valor intrínseco
era uma medida de custo, não era possível simplesmente contar o número de horas
e acres, exceto de um modo abstrato ou em ilustrações simples. Na verdade,
depois de estabelecer uma teoria preliminar da terra e trabalho de valor na
primeira parte, ele observa, no início da segunda parte, que para determinadas
mercadorias na economia real, é impossível fixar os seus respectivos valores
intrínsecos.
O outro conceito que ele
ressaltou foi o uso alternativo de recursos. A terra poderia ser usada para o
cultivo de milho ou para fornecer feno para os cavalos. E o trabalho poderia
ser realizado na fazenda ou treinado em um ofício. Cantillon viu claramente que
quando um proprietário escolhe possuir mais cavalos, ele está abrindo mão da
produção (e venda) de grãos, e que se a França desejava importar rendas finas,
então ela teria que renunciar a uma certa quantidade de vinho produzido em seus
vinhedos.
Cantillon entendeu
perfeitamente o conceito de custo de oportunidade e seu Essai foi uma tentativa de construir o conceito para explicar
escolhas econômicas. A descoberta do custo de oportunidade por este importante
precursor da Escola Austríaca marca sem dúvida a origem da teoria econômica.
Outro ponto da teoria de
Cantillon a ser ressaltado, especialmente em sua teoria monetária e bancária, é o dos custos de
transporte, porque o banqueiro (como o próprio Cantillon) serve como
intermediário para reduzir os custos de risco e de transporte de enviar grandes
quantidades de dinheiro ao longo de grandes distâncias. Cantillon foi o
primeiro economista a aplicar os princípios da economia espacial em um tratado
econômico geral. Deu contribuições originais e universais para a economia
espacial sobre a natureza de princípios facilmente aplicáveis para os campos da teoria
da localização e de preços internacionais.
Na segunda parte deste artigo serão abordadas as
teorias monetárias e dos ciclos econômicos de Cantillon.