Comentário do IMB:A
partitura é sempre a mesma. Basta
termos um ano em que o nível de chuvas está abaixo do esperado, e o governo já
começa a emitir alertas lúgubres sobre como essa seca irá afetar de maneira
pungente toda uma determinada região.
Curiosamente,
se você observar o histórico dos discursos do governo, verá que todo e qualquer
local do país está sempre vivenciando ou uma enchente catastrófica ou uma seca
catastrófica. Em nenhum momento o
governo diz que o país está vivenciando "a quantidade certa de chuvas".
Atualmente,
para o governo federal, o país é visto como uma terra árida que oscila entre
uma seca persistente e uma seca mais amena.
No
estado de São Paulo, a empresa estatal responsável pela distribuição de água
está aplicando, ainda que de forma velada, um
racionamento. Já se diz abertamente
que, "se as atuais condições persistirem", será necessário um racionamento mais
intenso.
Se
as atuais condições persistirem?
Trata-se de uma suposição interessante.
Por essa mesma lógica, durante a próxima temporada de chuvas poderíamos
dizer, que "se essas condições persistirem, será necessária a construção de uma
arca".
Condições climáticas nunca
persistem. Elas mudam. E burocratas odeiam esse fato.
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Seria
plausível supor que burocratas adoram secas.
Um período de seca lhes confere poder, e não apenas sobre o uso agregado
da água. Burocratas adoram saber que
estão no controle até dos mínimos detalhas das vidas das pessoas. Sob um racionamento, eles ordenam às pessoas
que tomem banhos mais curtos. Eles
ordenam às pessoas que deem menos descargas.
Eles tentam impor um profundo senso de culpa no cidadão que lava o carro
ou que simplesmente rega suas plantas.
Secas
podem transformar até mesmo o mais inocente e ingênuo funcionário público em um
equivalente moral a um agente de Gestapo, que emite decretos, impõe multas e,
no extremo, corta o próprio fornecimento de água — e tudo em nome do interesse
público.
Secas
tornam todas as pessoas dependentes do estado.
Todos são obrigados a obedecer às suas ordens e a seguir suas leis,
tipo, "Prédios de números pares podem utilizar um volume X de água entre 7 e
11h, e prédios de números impares podem utilizar esse mesmo volume entre 15 e
19h". Consequentemente, secas podem
jogar um vizinho contra o outro, e transformar as pessoas em uma "classe de criminosos",
que têm de se rebaixar a tomar banho escondidos para que ninguém perceba que
ele está gastando uma quota de água superior àquela determinada pelo estado.
Esse
comportamento estatal tem um nome: o ódio ao "consumismo". Ao passo que as pessoas querem ter opções
sobre como gastar seu dinheiro, burocratas querem que elas sofram
constantemente e estejam continuamente cientes de que estão utilizando um
produto sobre o qual o estado está no controle; as pessoas não devem confiar no
sistema de preços para balizar seu padrão de consumo, mas sim obedecer a regulamentações
e restrições estatais.
Perceba
que uma seca nunca termina oficialmente.
Durante o auge da seca, os jornais ficam repletos de alertas lúgubres
sobre uma iminente catástrofe. Porém,
quando a seca é substituída por chuvas torrenciais — e isso invariavelmente
ocorre —, não há nenhuma reportagem na imprensa falando algo do tipo "Graças a
Deus a seca acabou. As pessoas agora
podem consumir o tanto de água que estiverem dispostas a pagar."
Nunca. Eles nunca dizem isso. Eles preferem que carreguemos conosco aquela
sensação de que a seca nunca de fato acabou, já que, afinal, ela pode voltar novamente.
O
cerne do problema aqui nada tem a ver com chuvas ou com a alteração de padrões
meteorológicos. Com efeito, o tempo está
em contínua mudança desde a alvorada do universo. O que realmente cria o problema da escassez
de água é a propriedade estatal dos meios de produção, bem como o atual e
totalmente irracional sistema utilizado, no qual os preços não se alteram
independentemente da disponibilidade de água.
Não há uma preocupação nem com lucros e nem com prejuízos. Logo, não há um verdadeiro cálculo econômico
balizando as operações da estatal. Os
preços são determinados pelo governo, de acordo com conveniências políticas e
eleitorais; e não por indicadores extra-mercado.
Pense
na diferença entre esse sistema estatal e um sistema de mercado. Diariamente, nós consumidores somos induzidos
a consumir todos os tipos de bens de consumo imagináveis: desde carros,
celulares, computadores e apetrechos eletrônicos até alface e mandioca. Há uma constante calibragem entre oferta e
demanda. Se um produtor tentar
precificar excessivamente um determinado produto para tentar aumentar seus
lucros, outro empreendedor entrará em cena e, por causa de seus preços menores,
irá se apropriar dos consumidores que o primeiro perdeu. A inovação está em todos os cantos, de modo
que um aumento na oferta é continuamente necessário para atender a demanda. Caso contrário, o empreendedor vai à falência. Nenhum lucro é permanente. O lucro está continuamente
ameaçado. No mundo atual, a ameaça pode
surgir da noite para o dia.
Agora,
pense na diferença entre esse mercado, no qual você é estimulado a consumir
cada vez mais, e o mercado estatal de provisão de água. Neste mercado, o tema é sempre o mesmo: você
está usando água em excesso.
Não
é interessante? Dado que todos os
recursos existentes no planeta são escassos — o que significa que o minério de
ferro necessário para fabricar o aço dos automóveis também pode acabar, assim
como todos os alimentos existentes —, por que há esse apelo por racionamento
apenas no mercado de fornecimento de água?
Simples: porque esse mercado não é de funcionamento livre. E isso nada tem a ver com o produto em questão. Se você duvida, vá ao
supermercado ou à padaria mais perto de você e procure por uma garrafa de
água. Haverá várias marcas à sua
disposição, cada uma delas implorando para você consumi-la.
Já
no mercado estatal de água, seus "produtores" exigem que você conserve e
racione.
A
propriedade e o gerenciamento estatais dos meios de produção são a principal
razão desse comportamento. Privatize —
privatize completamente — a oferta de água e você verá uma mudança imediata
nesse padrão.
E
o motivo é muito simples. Empresas
privadas querem lucro. Se elas
perceberem que seus reservatórios ficarão vazios em decorrência de uma seca,
elas terão de fazer novos investimentos, caso contrário elas simplesmente não
terão água para fornecer e, consequentemente, não terão receitas e nem
lucros. Quanto mais alerta e voltada
para o lucro essa empresa for, maior será sua antecipação nos investimentos
necessários — ou seja, ela não deixará para investir apenas quando a seca se
materializar.
No
entanto, as pessoas imediatamente reagem a essa proposta dizendo que ela é
maluca e insensível. "Rios, lagos,
reservatórios e represas não podem ser propriedade privada! Os preços seriam extorsivos e os pobres
seriam os mais prejudicados!"
É
mesmo? Mais prejudicados do que
simplesmente não terem água para usar? Isso é que é humanismo e amor aos pobres...
No
que mais, em caso de aumento de preços em períodos de seca, não há por que
dizer que os pobres seriam afetados. E o
motivo é simples: maior preço gera menor demanda (não é esse o objetivo dos
conservacionistas?). Se a tarifa de água
subir, todas as pessoas irão reduzir seu consumo. Com um consumo reduzido, não há aumento na
conta a ser efetivamente paga.
Ou
seja, os pobres não serão afetados por um aumento nos preços porque preços altos
estimulam a redução do consumo; e, ao serem estimulados a reduzir seu consumo, o
valor final de sua conta não será aumentado.
Sim,
haverá uma queda na qualidade de vida, pois eles estarão utilizando menos água
pelo mesmo preço. Mas isso não é melhor
do que uma total escassez do produto?
A
total privatização da água é a melhor maneira para se evitar o desastre de um
racionamento. E, creiam, racionamentos
serão rotineiros porque não há incentivos significativos para se conservar a
água em seu atual estado socializado.
Uma transição para esse estado de coisas provavelmente será doloroso,
dado que mais de um século de socialização da água terá de ser desfeito. Mas é certo que esse processo seria
relativamente rápido em relação ao longo e exasperante sofrimento que o
socialismo no mercado de água ainda irá gerar.
Conclusão
O
governo, ao contrário do livre mercado, sempre vê o consumidor como algo
aborrecedor. Ao passo que, no livre mercado, as empresas estão sempre
ávidas por consumidores para os quais vender seus produtos, no setor público, o
consumidor é apenas um irritante demandante, um usuário esbanjador de recursos
escassos. No livre mercado, o consumidor é o rei, e os ofertantes estão
sempre se esforçando para ganhar mais consumidores, com os quais poderão lucrar
caso forneçam bons serviços. No setor público, cada consumidor é visto
como alguém que está utilizando um bem em detrimento de outra pessoa. No
livre mercado, todos os envolvidos em uma transação voluntária ganham, e as
empresas estão sempre ávidas para oferecer seus produtos ao consumidor.
No setor público, o consumidor é apenas uma chateação para os burocratas.
Seca
é apenas outro nome para escassez. O
governo é capaz de criar uma escassez de qualquer produto por meio de seu
gerenciamento burocrático. Preços não
respondem à lei da oferta e demanda, e uma total falta de investimento e
inovação caracteriza o gerenciamento da água pelo governo. Aliás, esse mesmo padrão de comportamento
pode ser observado nos Correios, na educação estatal, na saúde estatal, na
segurança estatal, na justiça estatal e em todas as outras áreas em que o
governo detém um monopólio. Não deveria
ser surpresa nenhuma haver escassez de água.
Quando
a água passar a ser fornecida por empresas operando em um ambiente concorrencial,
batalhando para satisfazer os consumidores e com isso terem lucros,
racionamentos serão coisas fictícias. No
atual arranjo, as empresas estatais ganham mais poder quando fazem os
consumidores sofrer. No livre mercado,
tal arranjo é inconcebível.
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Para mais detalhes sobre como privatizar e
gerar concorrência no setor de distribuição de água, veja este artigo:
Sobre as privatizações (final)
E depois este:
Privatize tudo