segunda-feira, 10 nov 2014
Com
o preço do petróleo do tipo Brent tendo despencado 22% nos últimos 12 meses —
estando hoje por volta de US$85 o barril —, o governo da Venezuela está
entrando em
desespero. Preços
menores colocarão enorme pressão sobre a economia venezuelana — totalmente
dependente das receitas da exportação de petróleo —, que hoje sofre com
profundos e crescentes desequilíbrios macroeconômicos.
No
entanto, mesmo com todos os problemas que essa redução no preço do petróleo
criou para seu governo, o presidente Nicolás Maduro decidiu dobrar a aposta
em suas atuais políticas econômicas. Em
vez de tentar uma impopular reforma econômica, Maduro está apenas à espera de
uma retomada dos preços do petróleo e de mais crédito fornecido pelo governo
chinês.
A
explosão nos preços das commodities ocorrida a partir de meados da década de
2000 permitiu que a Venezuela, que possui as maiores reservas comprovadas de
petróleo do mundo, mantivesse um volumoso programa de gastos sociais combinado
com controles de preços e salários e com um mercado de trabalho extremamente
rígido. Todo esse insano castelo de
cartas conseguiu se manter solvente por um bom tempo unicamente por causa das
receitas do petróleo.
No
entanto, uma redução na demanda mundial por petróleo em conjunto com um aumento
na produção no Oriente Médio e um forte aumento na produção de gás
de xisto nos EUA — que está fazendo com que o custo da energia venha caindo
vigorosamente nos EUA — derrubaram o preço do petróleo do tipo Brent
para o menor valor em quatro anos.
Estas
alterações serão profundamente sentidas na Venezuela, um país em que o petróleo
é responsável por mais de 95% das exportações da economia e por aproximadamente
45% de toda a receita do governo. A queda
nos preços do petróleo irá reduzir as receitas de exportação da Venezuela,
exacerbando o já monumental déficit orçamentário do governo — em 2013, quando
o preço do petróleo ainda estava alto, o
déficit orçamentário do governo foi de 11% do PIB — e restringindo sua
capacidade de acumular divisas internacionais.
Caso
o valor do barril do petróleo permaneça abaixo de US$120 — valor necessário
para o governo equilibrar seu orçamento —, a situação fiscal do governo irá se
deteriorar ainda mais.
Essa
escassez de receitas deveria fazer o governo Maduro repensar suas
estratégias. Ao longo dos próximos dois
anos, a Venezuela tem mais de US$28 bilhões em dívidas vincendas. Enquanto as dívidas se acumulam, a quantidade
de dólares em suas reservas internacionais caiu
para o menor valor em dez anos. O
Banco Mundial recentemente decretou que a ExxonMobil
deve ser indenizada pelo governo venezuelano em US$1,6 bilhão por ter tido
seus ativos expropriados no país.
Igualmente, a
empresa Gold Reserve também terá de ser indenizada em US$740 milhões pelo
governo venezuelano.
Mais
de uma dezena de casos semelhantes estão pendentes nos tribunais
internacionais, os quais elevariam em vários bilhões as obrigações da
Venezuela. Ainda no início deste ano, a Standard
& Poor's estimou em 50% as chances de a Venezuela dar o calote em sua
dívida ao longo dos próximos dois anos. Após
os últimos eventos, novas estimativas elevaram essa probabilidade para quase
100%.
A
reação de Caracas à queda nos preços do petróleo indica que o governo da
Venezuela manterá sua postura nos próximos meses. Algumas semanas atrás, Maduro veio a público para
repetir o
mantra favorito da esquerda latino-americana: ele disse que a queda nos preços
do petróleo foi causada por "inimigos estrangeiros" que querem "desestabilizar"
seu governo popular. Em seguida, a
Venezuela conclamou uma reunião de emergência com a OPEP para pedir aos
países-membros que reduzissem a produção e a oferta.
No
entanto, os países da OPEP ainda não demonstraram nenhuma intenção de atender
aos clamores de Maduro. A Arábia
Saudita, o único país com alguma capacidade de fazer grandes cortes em sua
produção, não parece propensa a alterar o atual arranjo, uma vez que a queda
nos preços está ajudando a proteger a decrescente fatia do país no mercado de
petróleo.
E
mesmo uma eventual e imediata redução na produção de petróleo pelos sauditas
não garantiria nenhuma retomada de preços: a capacidade da OPEP de determinar
os preços do petróleo foi severamente enfraquecida pelo estrondoso aumento na
produção de gás xisto nos EUA, o que vem erodindo o monopólio até então
usufruído pelos tradicionais ofertantes.
Adicionalmente, como já dito, a demanda global por petróleo está em
arrefecimento.
A
China parece mais propensa e mais bem posicionada do que a Arábia Saudita para
ajudar Maduro. Desde 2006, Pequim já
forneceu mais de US$50 bilhões em financiamentos para Caracas, sendo que a
quitação desses empréstimos foi acordada em termos de envio de petróleo para a
China, a preços de mercado. Uma
assistência adicional dos chineses poderia ajudar o governo madura a manter
seus elevados gastos, ou ao menos fornecer uma liquidez temporária para evitar
um iminente calote.
Em
última instância, essa assistência chinesa pode ajudar apenas temporariamente a
economia venezuelana. A acentuada queda
nos preços do petróleo expôs a frágil situação do país. Com as receitas do petróleo em baixa, o
governo venezuelano passou simplesmente a imprimir dinheiro para financiar seus
gastos. Oficialmente, a inflação de preços está em 60% ao ano. Mas estatísticas privadas
colocam esse valor em aproximadamente 350%.
A imposição de controle de preços gerou um desabastecimento generalizado
no país-
A
escassez crônica de
produtos básicos — como papel higiênico — e a imposição
de cotas para compras em supermercados estão gerando grande inquietação e
revolta entre os venezuelanos. Diariamente,
os venezuelanos descobrem que está cada vez mais difícil encontrar produtos
básicos, de remédios e fraldas a alimentos.
Para
desestimular uma revolta, o governo parou de divulgar estatísticas sobre a
escassez. O mesmo recurso foi utilizado
quando a criminalidade saiu do controle.
Para
piorar, a produção de petróleo do país desabou em decorrência da corrupção e da
incompetência dos burocratas que administram a estatal petrolífera PDVSA, a
qual é utilizada como um caixa sem fundo para financiar os programas do
governo. O desvio do dinheiro deixou a
empresa descapitalizada e impossibilitada de fazer novos investimentos. Como consequência, a produção de petróleo é
hoje 13%
menor do que era em 1999, quando Hugo Chávez assumiu o governo. Um país que boia sobre petróleo passou a ter
de importar o produto.
Várias
manifestações de rua foram suprimidas à força, com o governo mandando
para a cadeia os mais vocais opositores.
Não
é de se estranhar, portanto que a aprovação ao governo Maduro esteja em queda
livre. Para tentar conter uma
inevitável revolta popular, Maduro recentemente ordenou um aumento
de 15% no salário mínimo. Uma semana
antes, ele já havia ordenado um aumento de 45% no salário dos militares. Manter o apoio das forças armadas é essencial
para impedir um golpe de estado.
No
entanto, se a nova realidade econômica afetar o fluxo de dinheiro para
burocratas corruptos e para seus grupos de apoio, os quais lhe dão sustentação,
Maduro poderá enfrentar uma hostil oposição da elite do país.
Como
disse a revista
The Economist, a Venezuela é provavelmente o país que tem a pior gerência
econômica do mundo.