quinta-feira, 17 ago 2017
N.
do E.: O artigo a seguir foi adaptado para a realidade brasileira
Sejamos francos: a súbita fixação dos intelectuais,
dos políticos e da opinião pública com o tema do financiamento
de campanha — se deve ser privado (com doações de pessoas físicas e jurídicas)
ou público (com o dinheiro de impostos da população trabalhadora) — não fará
nada para incutir mais honestidade ao governo e nem muito menos aumentará as
liberdades econômicas e sociais de ninguém.
No entanto, há um aspecto positivo: essa azáfama dará
ao público uma lição de moral e cívica. Qualquer
que seja a modalidade adotada, ficará evidente que o governo não apenas não é
um agente neutro no que tange a critérios de justiça, como também é um esquema
corrupto por meio do qual aqueles mais politicamente poderosos enriquecem à custa de todo
o resto da população.
A corrupção, a propina, os lobbies, e a pressão dos
grupos de interesse têm
inevitavelmente de ser a regra quando se tem um governo que confisca quase 40% da renda da população,
que gasta R$
1,87 trilhão (ou R$ 2,53 trilhões se considerarmos o refinanciamento da dívida)
do dinheiro dos outros, que pode criar sem qualquer restrição leis e regulamentações que
beneficiem os mais bem politicamente conectados, e que assume poderes quase divinos sobre
todos os aspectos da nossa vida.
Quanto mais poder, dinheiro e privilégios estiverem em
jogo, mais alto será o preço que os espertalhões estarão dispostos a pagar para
ter acesso a essas mordomias. Não faltarão
grandes empresários para bancar campanhas políticas e exigir em troca privilégios como subsídios diretos, contratos para grandes obras, empréstimos subsidiados feitos por bancos estatais, restrições de importação, tarifas protecionistas e reservas de mercado garantidas por agências reguladoras (que existem para cartelizar o mercado e impedir a entrada de concorrentes).
Quando lobistas, grupos de interesse, empreiteiros e grandes empresários
têm de competir entre si para ter acesso a essas prebendas distribuídas por políticos, mais alto será o preço
cobrado pelos políticos e reguladores para lhes conceder tais delícias.
Por isso, sempre que um partido político vier a
público acusando os outros de corrupção, eis a regra: acredite em cada palavra. Tudo o que um diz sobre o outro é
verdade. Eles estão lá dentro e sabem
perfeitamente de tudo o que ocorre.
O
problema com o financiamento público de campanha
Em termos de governo, tamanho e corrupção andam de mãos
dadas. Enquanto
suas receitas forem coercivamente confiscadas da população, o governo pode
perfeitamente desconsiderar o interesse público e se concentrar apenas em
recompensar seus amigos e punir seus inimigos.
Por tudo isso, a questão do financiamento de
campanha é apenas um aspecto do problema geral, mas é um aspecto
particularmente interessante. Por ora,
estamos ouvindo que o financiamento privado tem de acabar porque ele
gera favoritismo e isso seria ilegal. Mas
o problema com esse raciocínio é que a vasta maioria do favoritismo gerado pelo financiamento privado de campanha é perfeitamente legal.
Subsídios diretos, empréstimos subsidiados feitos por bancos estatais, contratos para obras públicas, restrições de importação, reservas de mercado, regras de conteúdo local
que privilegiam fornecedores nacionais etc. são medidas legais adotadas exclusivamente com o intuito de privilegiar grupos de interesse, os quais bancaram as eleições dos políticos.
Embora sejam claramente imorais e anti-éticas —
pois utilizam o dinheiro dos pagadores de impostos em prol de empresários politicamente
bem relacionados, proíbem a concorrência, e restringem as opções de compra dos
consumidores —, tais medidas jamais mereceram investigações por parte de comissões
parlamentares.
O problema, portanto, não é o financiamento privado em si, mas sim o tamanho do estado.
Perante tudo isso, aqueles que ainda creem na ficção de
que "é possível termos um governo bom e honesto" decidiram — acometidos por uma confusão de causa e consequência — defender uma completa reforma
do financiamento de campanha: para acabar com a influência dos grupos de
interesse, eles defendem não a redução do estado mas sim a proibição de todo e qualquer tipo de doação privada. Pior:
querem que os pagadores de impostos banquem integralmente os altos custos das campanhas políticas.
Por mais execrável que seja o atual arranjo, este
outro conseguiria ser ainda pior.
No atual arranjo, ao menos ainda há uma chance, por
menor que seja, de que um cidadão comum e genuinamente bem intencionado faça
alguma diferença. De tempos em tempos,
um cidadão tipo Ron
Paul pode surgir e desequilibrar o equilíbrio dos partidos dominantes. Ele pode conseguir alterar os termos do
debate e, com isso, impedir que a atual elite política consiga o completo
controle sobre um processo democrático que já está todo adulterado e
manipulado.
Por outro lado, com um financiamento público de
campanha, tal possibilidade seria nula. O
financiamento público de campanha, ao distribuir o dinheiro do povo de acordo
com a representação de cada partido, simplesmente impede que "forasteiros" e "intrusos"
participem do processo. Mais ainda: o
financiamento público de campanha impede que "intrusos" e "forasteiros" sejam
financiados por seus apoiadores e, com isso, tragam algum risco para toda a
máquina política já estabelecida.
O efeito do financiamento público de campanha será
simplesmente o de perpetuar os políticos profissionais, impedindo que "forasteiros"
e "intrusos" participem do processo.
Quanto mais dinheiro de impostos for derramado nas
campanhas políticas, mais o sistema será desvirtuado e corrompido em prol da
elite política que já está no poder.
Contribuições
privadas podem, sim, trazer efeitos benéficos
Vale ressaltar que contribuições privadas a
campanhas políticas — mesmo aquelas que influenciam diretamente o que um
senador, deputado ou presidente irá fazer — não são, por si só, ruins e maléficas. Tudo depende de se o interesse que está sendo
defendido está de acordo com o interesse público.
Por exemplo, digamos que um grupo anti-impostos
financie a campanha de um senador. Tão logo
o senador é eleito, esse grupo exige que ele retribua o favor criando leis que
reduzam profundamente os impostos. Isso não
é corrupção, pois o resultado de um corte de impostos é tornar as pessoas mais
livres, permitindo que elas retenham mais do seu próprio dinheiro. Ninguém foi roubado nesse processo. Não se aumentou a coerção sobre terceiros. A liberdade de ninguém foi tolhida.
Por outro lado, suponhamos agora que um grupo pró-impostos
financie a campanha de outro senador. Tão
logo este é eleito, o grupo exige que ele retribua o favor criando projetos de
lei que elevem impostos. Isso, sim, é corrupção. E é corrupção não pelo fato de o senador
ter recebido dinheiro privado ou estar retribuindo um favor, mas sim pelo fato
de ele estar aumentando a espoliação e destruindo a riqueza da sociedade. Essa medida do senador seria imoral e maléfica
independentemente de ele ter recebido contribuições de campanha ou não.
Na política, assim como no mercado, dinheiro e
influência andam de mãos dadas. A questão
passa a ser como se dá essa combinação. Se
ela for utilizada em detrimento da sociedade livre, então ela tem de ser
condenada. Se ela for utilizada para
promover um genuíno bem comum — como quando ela atua em prol da liberdade —, então
ela merece elogios.
E o raciocínio acima pode ser aplicado a qualquer área. Imagine, por exemplo, que uma fabricante
estrangeira queira vender carros baratos para os consumidores brasileiros. Atualmente, ela é impedida de fazer isso por
causa das altas tarifas de importação vigentes para proteger o cartel das
montadoras nacionais. O político que
aceitar esse dinheiro estrangeiro e batalhar contra essas tarifas de importação
estará fazendo exatamente aquilo que um
homem público deveria fazer: trazendo mais liberdade para os consumidores,
aumentando seu poder de compra, aumentando suas opções de compra e acabando com
as reservas de mercado.
Não há nenhuma base econômica ou moral para se impor
qualquer restrição legal às opções de compra e venda de uma população.
O mesmo raciocínio se aplica a subsídios, a regulamentações
anti-empreendedores, a agências reguladoras que protegem empresas já estabelecidas e fecham o mercado contra a concorrência, a empréstimos feitos por bancos públicos
que são subsidiados pelo Tesouro, a contratos com empreiteiras que são pagas
com dinheiro de impostos etc.
Conclusão
O fato é que quantias
inimagináveis de dinheiro são hoje utilizadas para financiar eleições. Se o governo fosse menor — e como consequência
as pessoas fossem mais livres —, essa quantidade de dinheiro gasta também seria
inevitavelmente menor.
Se este é o objetivo, a única maneira de alcançá-lo
é reduzindo os privilégios que estão em jogo a cada eleição. Retire poderes do governo, e o interesse dos
grandes grupos empresariais em controlá-lo também cairá. Afinal, quanto maior e mais poderoso um
governo, quanto mais leis e regulamentações ele cria, mais os empresários
poderosos e com boas conexões políticas irão se aglomerar em torno dele para
obter privilégios.
Enquanto não chegarmos a esse ponto, a única alteração
no financiamento de campanha que vale a pena ser perseguida é remover todos os
limites às contribuições pessoais e empresariais. Impedir conflitos de interesse é fácil: basta
abolir todos os privilégios garantidos pelo governo, todos os subsídios, todas
as regulamentações e tarifas que foram implantadas apenas para proteger grandes
empresas. Favores legais que são implantados
à custa de terceiros não deveriam estar disponíveis, qualquer que seja o preço. A liberdade, que deveria ser garantida por
direito, jamais deveria estar à venda.
De resto, o que nós deveríamos fazer enquanto o
Congresso, a presidência e os partidos políticos debatem esse tema? Regozijarmo-nos com o fato de que, enquanto
debatem, eles não estão fazendo suas atividades rotineiras.