segunda-feira, 25 abr 2016
Em nossa época, a ideologia dominante foi dividida, de uma forma
simplista, entre os pensamentos de direita e de esquerda. Consequentemente, por causa dessa dicotomia, tornou-se frequente vermos a defesa de somente uma
parte das ideias de liberdade nesses dois espectros.
Na direita, costuma-se
defender, sempre com restrições, o livre mercado e o direito à auto-defesa. Na esquerda, a bandeira aproveitável é a das
liberdades sociais (mas mesmo estas são defendidas com uma retórica um tanto
belicista, e quase sempre visando aos interesses de alguma coletividade bem
organizada, e não aos interesses do indivíduo).
Obviamente, há um grande
problema em ambas as posturas: não é possível defender somente alguns dos
espectros da liberdade. Não
existe meia liberdade. Quem é meio livre é também, por definição, meio preso.
A definição entre direita e
esquerda é incompleta. Friedrich August von Hayek, no livro Os Fundamentos da
Liberdade, especificamente no capítulo "Por que não sou conservador",
apresenta a ideia de um triângulo no qual os ângulos seriam divididos entre conservador,
socialista e liberal. Diz ele:
Se
utilizássemos um diagrama, a figura mais apropriada seria a de um
triângulo, com os conservadores ocupando um ângulo, os socialistas puxando para
o segundo e os liberais para o terceiro. Contudo, como os socialistas há muito
tempo exercem maior pressão, o que ocorreu foi que os conservadores tenderam a
ser arrastados pelo pólo socialista mais que pelo pólo liberal e, sempre que
lhes convinha, adotaram as idéias que a propaganda radical fazia parecer
respeitáveis.
Comumente, foram os conservadores
que fizeram mais concessões ao socialismo, chegando mesmo a empunhar suas
bandeiras. Defensores da política de centro, desprovidos de objetivos próprios,
os conservadores sempre se pautaram pelo princípio de que a verdade está entre
os extremos — e, consequentemente, mudam sua posição toda vez que um movimento
mais radical surge em qualquer um dos lados.
Já de acordo com as
palavras do escritor peruano Mario Vargas Llosa:
Eu sou um liberal. A extrema esquerda converteu essa palavra em um
palavrão, xingamento, mas ela se origina da palavra liberdade, a palavra
mais bonita do idioma, que trouxe as grandes conquistas: a tolerância,
os direitos humanos, a divisão de poderes, o pluralismo político. Todas as
grandes conquistas da civilização têm sua origem no progresso da liberdade.
No trecho acima, Llosa demonstrou, em uma pequena e simples afirmação, o que significa a liberdade, abordando várias de
suas perspectivas: as liberdades políticas,
jurídicas, sociais e econômicas.
Todavia, antes de demonstrar
a correlação entre cada uma dessas liberdades, é necessário destacar o que
significa 'liberdade'. Como essa palavra tão bonita deve ser utilizada? E como
seria possível trazer essa realidade para a nossa vida e para o Brasil?
Em todas as oportunidades em
que o mundo cresceu e enriqueceu de forma exponencial, as ideias de liberdade
eram as ideias dominantes. Foram elas
que permitiram que os indivíduos, ao colocarem em prática suas idéias,
tornassem o mundo mais rico e próspero.
Segundo Ludwig von Mises, em sua obra Ação Humana,
"o homem é livre quando ele pode escolher os fins e os meios que serão utilizados
para alcançar tais fins." Mises enfatiza que há liberdade quando se pode
exercer a ação humana, ou seja, quando "o agente homem está ansioso para
substituir uma situação menos satisfatória, por outra mais satisfatória."
Nas palavras
de Donald Stewart Jr., em seu artigo A Lógica da Vida, ninguém
trocaria 10 por 9, ou seja, ninguém voluntariamente sairia de uma condição de
maior bem-estar para uma situação de menor bem-estar, o que é resumido nesse
pequeno trecho:
Obviamente, ninguém troca 10 por 9: ninguém troca 10 reais
por 9 reais. Quem quiser assim proceder
não precisa encontrar um parceiro para efetuar uma troca: basta renunciar ao
que tem. Os que assim o desejarem são livres para fazê-lo até o limite
de suas propriedades, num primeiro momento, e até o sacrifício de sua própria
vida, num caso mais extremo.
Convém esclarecer, apenas
por uma questão de precisão conceitual, que quem assim agisse, por livre e
espontânea vontade, não estaria trocando 10 por 9; estaria preferindo se
desfazer daquilo a que atribui menos valor — seus bens e sua própria vida —
para receber em troca aquilo a que atribui maior valor — a gratidão dos que
beneficiou ou a satisfação íntima de ter feito o que considera ser um bem.
Ninguém, de livre e espontânea vontade, troca 10 por
9. É uma impossibilidade lógica. Ninguém conseguirá apontar uma situação ou uma
circunstância em que essa regra possa ser negada. Embora, na vida real, as
escolhas que temos de fazer sejam bem mais complexas, por mais complexas que
sejam, a lógica subjacente é sempre a mesma: ninguém troca aquilo a que atribui
mais valor — no sentido mais amplo do termo — por algo a que atribua um valor
menor.
Ou seja: ninguém age para causar a si próprio uma
insatisfação.
A lógica da vida
é a lógica da ação humana. No entanto, em algumas circunstâncias, somos obrigados a trocar 10 por 9. Donald Stewart
Jr. apresenta um caso em que isso ocorre:
[Isso] ocorre quando nos vemos diante de uma situação
de coerção, hipótese em que, ao nosso ganho, somos forçados a acrescentar o
benefício de não sofrer a violência decorrente da coerção, seja ela legal ou
ilegal.[...] Somos levados a fazer uma troca que nos é insatisfatória; e só
aceitamos fazê-la para evitar uma possível represália, em virtude da existência
de um poder de coerção.
Ou seja,
quando ocorre coerção, há uma violação da 'lógica
da vida', e é nessas circunstâncias que as liberdade políticas,
jurídicas, sociais e econômicas são desrespeitadas.
A liberdade
econômica é a mãe de todas as liberdades.
É por meio dela que é possível obter as outras liberdades. Sem liberdade econômica é impossível haver até
mesmo moralidade. Dado que o mercado é a
consequência da liberdade econômica e da cooperação social pacífica, é ele, o
mercado, quem torna possíveis a liberdade, a justiça, a moralidade, a inovação
e a harmonia social.
Como escreveu Mises:
Um homem só tem liberdade
enquanto puder moldar sua vida de acordo com seus planos. [...] A
liberdade não é apenas um postulado político; ela é um postulado de toda a
moralidade, seja ela religiosa ou secular. A moralidade só
faz sentido quando dirigida para indivíduos que são agentes livres.
Algumas
consequências práticas da liberdade econômica
Quanto mais livre um país é em
termos econômicos, mais liberdade política, jurídica e social esse país tem. Maior liberdade econômica gera uma menor pobreza,
o que significa que a condição de vida em países mais livres é muito melhor do
que em países menos livres:

Gráfico 1: no eixo Y, a taxa de pobreza; no eixo X, o grau de liberdade
econômica (quanto mais à direita, mais economicamente livre)
Adicionalmente, nos países mais livres o
crescimento econômico observado é maior, permitindo mais emprego e mais renda
para as pessoas:

Gráfico 2: no eixo Y, o crescimento econômico; no eixo X, o grau de
liberdade econômica (quanto mais à direita, mais economicamente livre)
Adicionalmente, quanto mais liberdade econômica
o país tem, melhor é o seu IDH:

Gráfico 3: no eixo Y, o IDH; no eixo X, o grau de liberdade econômica
(quanto mais à direita, mais economicamente livre)
Os países mais livres ainda possuem uma maior expectativa de vida, uma
menor mortalidade infantil, maior acesso a água potável, e maior proteção ao meio
ambiente. Ou seja, quanto mais livre
um país é, melhor é a qualidade de vida, protegendo principalmente as crianças
e os mais velhos:

Gráfico 4: no eixo Y, a mortalidade infantil; no eixo X, o grau de liberdade
econômica (quanto mais à direita, mais economicamente livre)

Gráfico 5: no eixo Y, a taxa de acesso à água potável; no eixo
X, o grau de liberdade econômica (quanto mais à direita, mais economicamente
livre)
Os países mais livres apresentam também índices de corrupção muito menores do
que nos países menos livres, sendo bem mais transparentes, respeitando a
propriedade privada e os contratos firmados entre as partes. Eles entenderam a máxima de Tácito, que diz
que "quanto mais corrupto o estado, maior
o número de leis".

Gráfico 6: no eixo Y, o índice de percepção da
corrupção (quanto maior o valor, menor a corrupção percebida); no eixo X, o
grau de liberdade econômica (quanto mais à direita, mais economicamente livre)
Já o Brasil,
nos últimos três anos, caiu vinte e duas posições no ranking de liberdade
econômica, segundo a Heritage Foundation.
Em 2014, o Brasil era o 100º colocado; em 2015, já havia caído para 114º, e
nesse ano é o 122º país menos livre no mundo. Tal situação vem prejudicando
diversos outros índices.
O país também caiu uma posição
no IDH, sendo
hoje o 75º lugar. No ranking da educação, em que foram avaliados 40 países,
o Brasil é o 35º (trigésimo quinto), e a posição de corrupção é lastimável:
somos o 76º.
Para completar, no Brasil, temos uma legislação gigantesca que muitos afirmam ter sido criada para
"proteger o cidadão", sendo que, na realidade, seu único efeito prático é prejudicar,
diariamente, o crescimento econômico e a liberdade empreendedorial dos
brasileiros.
As legislações tributárias
municipais, estaduais e federal foram reunidas pelo advogado
Vinícios Leôncio em um só livro, intitulado Pátria
Amada. Este livro é considerado
o maior do mundo, segundo o Guinness Book, tendo 2,10 metros de altura e
pesando 7,3 toneladas.

O advogado tributarista Vinicios
Leoncio e seu livro Pátria Amada
Enquanto a realidade brasileira é
ter esse absurdo de legislações — que dificultam ao máximo o surgimento de novas
empresas; que impõem custos operacionais proibitivos para as empresas já
existentes; que tornam praticamente impossível para os mais pobres saírem da sua
condição de pobreza; que, sem suma, violam a lógica da liberdade —, os países
mais livres têm muito menos legislações e uma menor carga tributária.
Nos países mais livres é
possível abrir uma empresa em 9,2 dias, em média. Já no Brasil, o tempo é de, em média, 118
dias. Há destaques
negativos: em Fortaleza, a demora chega a 245 dias; em Porto Alegra, 260
dias — coincidentemente, duas cidades que têm ou tiveram governos de esquerda
nos últimos anos.

Gráfico 7: no eixo Y, o número de dias necessário para
se abrir uma empresa, em média; no eixo X, os agrupamentos de países
Como a liberdade não pode ser pela
metade, a propriedade é uma das suas características indissociáveis. Em muitas
palestras, eventos e aulas que ministrei pelo Brasil, sempre perguntei qual o
maior sonho do brasileiro. Invariavelmente,
ouvi como resposta "a casa própria".
É sempre muito estranho
observar isso, uma vez que o direito de propriedade é um dos mais
desrespeitados do Brasil, sendo extremamente burocrático e caro registrar uma
propriedade em nosso país, conforme demonstra o gráfico abaixo.

Gráfico 8: no eixo Y, a quantidade
de procedimentos necessários para se registrar uma propriedade, em média; no eixo X, os
agrupamentos de países.
Conclusão
Embora a liberdade plena não exista, é sempre possível nos aproximarmos
do seu ideal. E, indiscutivelmente, os países
que mais se aproximaram deste ideal são os que apresentam hoje os melhores
indicadores econômicos e sociais.
No entanto, nesta nossa incessante busca pela liberdade, é de crucial importância
não nos contentarmos com pouco. Pequenos
avanços rumo a uma maior liberdade, embora devam sim ser comemorados, não podem
nos fazer relaxar e nos tornar relapsos. A batalha deve ser contínua e implacável.
Jamais nos esqueçamos desta verdade: a liberdade não pode ser fragmentada em compartimentos. A liberdade é indivisível. Meu amigo Carlos Góes, do Mercado Popular,
explicou bem isso:
Direitos e liberdades individuais não
fazem sentido se forem compartimentalizados. Não fazem sentido se seletivamente
aplicados a alguns indivíduos. Liberdade só é liberdade se você a garante para
quem discorda de você; ela é universal e inalienável. E liberdade só é
liberdade se ela não vier em partes – ela é universal e indivisível.
E a bota da opressão estatal sempre será pesada quando pressionada
contra o seu pescoço. Seja ela a bota esquerda ou a bota direita. Por isso, não nos contentemos com
migalhas. Vamos tirar toda e qualquer
bota, por mais leve que ela seja, de cima de nós.
A liberdade está chegando ao
Brasil? Pode ser. O fato é que essas ideias nunca estiveram tão
fortes e nunca tão difundidas como agora.
Há motivos para alguma esperança.