quinta-feira, 22 jul 2021
Como todos já sabem, a Olimpíada é um evento
financiado, em grande medida, pelos governos do país-sede
— ou seja, pelos pagadores de impostos, queiram eles ou não.
Embora alguns países
tenham programas de voluntariado e façam arrecadações voluntárias para bancar
alguns atletas, o fato é que boa parte do financiamento vem do governo. O governo normalmente constrói os estádios e
as demais instalações necessárias para sediar o evento. E, alguns casos, chega a arcar com a maior fatia do
financiamento.
Mas nem sempre foi
assim.
Quando chegou a época de
as cidades ao redor do globo apresentarem sua candidatura para sediar a
Olimpíada de 1984, ninguém se voluntariou. À época, sediar os jogos olímpicos era visto como o que realmente são:
um risco financeiro.
Após ter sediado a
Olimpíada de 1976, a cidade de Montreal se viu com uma
dívida de US$ 1,5 bilhão. Os jogos
foram um desastre financeiro para a cidade, a qual só conseguiu finalmente
quitar toda a dívida no ano de 2006.
Para agravar os ânimos,
os jogos olímpicos de Moscou, em 1980, também foram outro desastre
financeiro.
Os
pagadores de impostos impõem o limite
Afetada pelo desastre
financeiro ocorrido em Montreal e ainda tendo de lidar com a turbulência e a agitação
política da Guerra Fria, a Olimpíada de 1984 não se mostrou exatamente muito
popular em termos de atrair cidades-sede. Com efeito, no último minuto, apenas duas cidades haviam oficialmente se
candidatado: Nova York e Los Angeles.
Los Angeles acabou
vencendo a disputa, mas seus cidadãos não estavam nada entusiasmados com essa
vitória. Tampouco estavam dispostos
a bancar toda a festa. Eles estavam tão inflexíveis em seu propósito de proteger seus dólares de
impostos contra qualquer gasto esbanjador, que conseguiram aprovar um
projeto de lei proibindo o uso de dinheiro público para construir as instalações
olímpicas.
Consequentemente, a
cidade tinha agora a honra de sediar os jogos olímpicos, mas não tinha como
pagar.
Felizmente, um
empreendedor local chamado Peter Ueberroth — que
tinha a fama de ser extremamente competente em lidar com orçamentos apertados
— entrou em cena e assumiu a iniciativa do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos
de Los Angeles (LA84).
Formado por outros empresários
de sucesso, bem como por indivíduos sagazes e de mentalidade empreendedora, o
objetivo do Comitê era simples: encontrar financiamento privado para a
Olimpíada, uma façanha que até então jamais havia sido feito.
De início, os críticos
e os céticos não gostaram nada da ideia de deixar o destino dos jogos olímpicos
de 1984 nas mãos de um comitê formado por executivos do setor privado. Mas acabaram se dobrando aos fatos.
Com bem resume esse
verbete da Wikipedia:
O
Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Los Angeles (LA84) deixou claro ao
Comitê Olímpico Internacional (COI) que a cidade não arcaria com nenhum
eventual custo adicional e que as instalações esportivas já existentes seriam
as mais utilizadas, em particular o Los Angeles
Memorial Coliseum, que havia sido construído para as Olimpíadas de 1932
(outra época em que ninguém queria sediar os jogos).
O
Velódromo Olímpico e o Estádio Olímpico de Natação, financiados pela McDonald's
e pela 7-Eleven respectivamente, foram as únicas duas instalações construídas especificamente
para os jogos olímpicos.
Os
baixos custos de construção, em conjunto com a forte dependência de
financiamento privado, permitiram aos jogos gerar um lucro de mais de US$ 200 milhões
à época (equivalentes a US$ 522 milhões hoje, ou mais de R$ 2,7 bilhões de
reais), fazendo daqueles jogos olímpicos, de longe, os mais financeiramente
bem-sucedidos da história.
Ao final, portanto, não apenas o Comitê gastou menos
do que o previsto, como ainda conseguiu ter um lucro substantivo — e ter algum
lucro era algo que, até então, só havia acontecido uma vez na história.
Por meio de arrecadações
privadas, patrocínios de empresas, e muita disciplina fiscal, o Comitê
conseguiu realizar o impensável. Em vez
de esbanjar milhões, se não bilhões, na construção de novas instalações, o LA84
simplesmente utilizou arenas e instalações universitárias que já existiam.
Também algo inédito à época,
o Comitê fez história ao vender os direitos exclusivos de transmissão para
apenas uma rede de televisão. A American
Broadcasting Company (ABC) pagou a modesta quantia de US$ 225 milhões para ser
a única fonte de transmissão, dentro dos EUA, dos jogos olímpicos.
Para alojar os atletas,
o LA84 optou por utilizar os dormitórios das faculdades e universidades, bem
como todos os outros tipos de alojamentos espalhados pela cidade, em vez de
construir uma faustosa e custosa "Vila Olímpica", algo que se tornou tradição nas
outras cidades-sede.
No final, os jogos olímpicos
de Los Angeles, de 1984, tiveram um custo total de US$ 546 milhões. Quando comparado aos US$ 50 bilhões gastos em
2013 nos jogos olímpicos de inverno em Sochi, a quantia gasta pelo LA84 parece
praticamente irrisória.
Conclusão
O fato é que as
olimpíadas são um grande negócio. Os direitos
de transmissão são extremamente caros e muito demandados. As receitas de turismo na cidade-sede são enormes,
bem como as vendas de ingressos para os eventos.
De resto, o Comitê Olímpico Internacional
(COI) é uma organização internacional, não-governamental
e sem fins lucrativos localizada na Suíça. Logo, não há absolutamente
nenhum motivo para governos se envolverem e terem de utilizar dinheiro de
impostos para bancar as olimpíadas. Um evento
capaz de gerar todo esse volume de receitas pode ser perfeitamente organizado
por um conglomerado de empreendedores em busca do lucro. Não apenas tragédias financeiras como
Montreal e Moscou [e, agora, Brasil] teriam sido evitadas, como também uma tremenda eficiência de
custos teria sido realizada.
E, embora não seja de
todo o correto dizer que os jogos olímpicos de 1984 foram um empreendimento
100% privado (houve algum auxílio do governo federal), a Olimpíada daquele ano mostrou ao mundo que, no que diz
respeito a sediar olimpíadas, a privatização não só é possível, como também é a
maneira mais eficiente de fazer o serviço.
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