Começarei
primeiro afirmando minha posição. Em seguida, apresentarei argumentos para
sustentá-la. E concluirei comentando o ponto realmente crucial, que é bastante
ignorado nos debates.
O cenário
O
enriquecimento econômico de uma sociedade é um fenômeno que, tipicamente,
envolve a realocação de mão-de-obra: esta sai da produção industrial e vai para
o setor de serviços.
Mas
tal fenômeno, por si só, não gera uma
redução na produção industrial.
O
declínio da produção industrial observado em países como EUA e França nos
últimos trinta anos se deve, em parte, à exportação de capitais (empresas que
se mudam para outros países), mas principalmente ao intervencionismo
governamental na forma de crescente burocracia e regulações sobre os negócios, leis
trabalhistas mais rígidas que as asiáticas, carga tributária crescente, políticas
educacionais ruins, problemas previdenciários e sindicatos agressivos exigindo privilégios
crescentes.
Esse
declínio não será interrompido, e nem muito menos revertido, por meio de mais intervenções
governamentais — mesmo que estas sejam criadas com o genuíno desejo de reindustrializar
o país.
Agora,
algumas considerações para sustentar essas alegações.
As causas
A
realocação da mão-de-obra em uma economia em crescimento resulta
majoritariamente da acumulação de capital e das mudanças de preferência de
consumo da população.
Isso
faz com que novos investimentos e ampliações da estrutura de produção da
economia sejam uma constante. Tal fenômeno, por sua vez, exige que o setor dedique
mais tempo à invenção de novos métodos, à preparação da atividade industrial, à
coordenação e ao monitoramento das cadeias de fornecimento.
Nesse
cenário, a demanda por mão-de-obra industrial de baixa qualidade diminui, e há
um aumento na demanda por mão-de-obra industrial de alta qualidade. No entanto,
o que realmente aumenta é a demanda por mão-de-obra administrativa, cuja função
é gerenciar a logística das cadeias de fornecimento. Ou seja, aumenta a demanda
por mão-de-obra especializada em resolver problemas.
O
aumento da renda real da população afeta suas demandas e seu estilo de vida. Em
vez de trabalhar longas horas, as quais geram apenas uma recompensa monetária,
as pessoas cada vez mais passam a preferir atividades mais agradáveis que forneçam
uma imediata recompensa psicológica e emocional. Daí a explosão de atividades artísticas,
intelectuais e científicas nos países desenvolvidos, em detrimento do
tradicional emprego industrial.
Assim,
como consequência natural do crescimento econômico, a produção industrial
declina em relação ao nível em que poderia estar caso continuasse atraindo mão-de-obra.
Mas
isso, por si só, não implica uma redução na produção física industrial. Tampouco
implica uma redução no faturamento das indústrias. A acumulação de capital e o
progresso tecnológico tornam possível à indústria prosperar mesmo havendo menos
pessoas empregadas nela. A
Alemanha é um grande exemplo disso.
Nos
últimos trinta anos, os capitalistas ocidentais investiram grandes quantias de
capital nos países orientais. Essa realocação de capital, embora benéfica do ponto
de vista da economia mundial, foi deletéria no curto prazo para o
desenvolvimento industrial daqueles países ocidentais nos quais este capital
teria sido aplicado não fossem os orientais.
Porém,
os investimentos em capital nos países ricos caíram muito mais em decorrência da
explosão de vários tipos de intervenções governamentais:
a)
Os generosos benefícios assistencialistas diminuem os incentivos para se aceitar
empregos industriais que pagam pouco e exigem muito.
b)
Subsídios maciços para a educação universitária prolongam o período acadêmico
dos jovens, reduzem a oferta de mão-de-obra industrial qualificada, e criam uma
predisposição para a busca de atividades científicas, intelectuais e artísticas.
c)
O arsenal de regulações fez com que, de um lado, os custos para se empreender
se tornassem cada vez maiores; de outro, estimulou o rent-seeking e várias
outras formas de se obter privilégios via conexões políticas. Hoje, essas regulações
garantem o emprego de um exército de lobistas, advogados, contadores, auditores
e conselheiros financeiros, tudo à custa do empreendedorismo tradicional.
O
cerne da riqueza moderna
Tendo
explicado tudo isso, passo agora para o ponto crucial: essas intervenções governamentais
apenas aceleraram um fenômeno que sempre foi inevitável. A redução da mão-de-obra
no setor industrial é um fenômeno natural e inexorável.
No
mundo atual, e cada vez mais no futuro, o cerne da riqueza não está no setor
industrial; o cerne da riqueza está no conhecimento.
Mais
especificamente, o conhecimento que é aplicado com o intuito de aumentar a
riqueza das massas por meio dos serviços. Esses serviços podem
ser digitais ou podem ser pessoais. Mas não são baseados na manufatura.
No
mundo contemporâneo, a riqueza está na venda de ideias, na venda de eficiência, na
venda de entretenimento, na venda da solução de problemas e, acima de tudo, na venda
de qualquer método que permita reduzir os custos das matérias-primas, o custo
do capital e o custo da produção.
Por
isso, é de se esperar que a indústria tenha cada vez menos mão-de-obra empregada
em serviços mecânicos e repetitivos, seja cada vez mais equipada por máquinas
totalmente controladas por programas computacionais, e, acima de tudo, tenha
uma demanda crescente por poucas pessoas capazes de apresentar idéias e
demonstrar aptidão para solucionar problemas.
A
mão-de-obra mais demandada pela indústria não será a do chão de fábrica (cada vez
mais substituída por robôs), mas sim a do gerente capaz de administrar a logística,
coordenar a cadeia de suprimentos e, acima de tudo, apresentar soluções para
problemas.
Isso,
em si, é ótimo. Utilizar mão-de-obra humana para fazer esforços repetitivos e
puramente mecânicos é um grande desperdício de recursos escassos. O uso de
máquinas e de inteligência artificial permite que a humanidade seja libertada
do fardo do trabalho maçante e exaustivo, e passe a se dedicar ao conhecimento
e à solução de problemas.
A
participação da indústria na economia irá diminuir, assim como a quantidade de
pessoas empregadas neste setor. Mas isso não significa que sua produtividade
será menor. Ela será apenas mais eficiente.
Ao
redor do mundo, as nações industrializadas terceirizaram sua base manufatureira
de duas maneiras: ou transferiram suas indústrias pesadas para países estrangeiros
extremamente pobres ou adotaram programas computacionais que não reclamam de
fazer trabalho pesado (e o fazem com extrema eficiência). Os trabalhos
passaram a ser efetuados com uma qualidade ímpar tanto por pessoas pobres em
países estrangeiros quanto por robôs que estão se tornando cada vez mais
eficientes em decorrência da adoção de melhores técnicas de produção e de
melhores programações computacionais.
Essa
tendência é irrevogável.
Por
tudo isso, a riqueza, cada vez mais, estará na capacidade de apresentar soluções
para problemas. No setor industrial, a riqueza estará com aquele que souber apresentar
idéias para cortar custos, cortar preços e resolver problemas. Mas esses, por definição,
serão uma ínfima minoria.
A
quantidade de mão-de-obra humana empregada na indústria irá continuar diminuindo.
Conclusão
O gráfico abaixo mostra a participação da indústria no PIB dos países mais ricos do mundo. A linha azul mostra a participação da indústria japonesa no PIB japonês; a laranja, a dos EUA; a verde, a da Finlândia; a vermelha, a da Alemanha; a preta, a da Holanda; e a vermelha grossa, a média mundial.

Como se pode ver, o percentual de contribuição da indústria à produção econômica total vem declinando continuamente ao longo dos últimos 40 anos. Se o gráfico mostrasse mais 40 anos anteriores, o mesmo tipo de declínio seria perceptível.
Trata-se de um fenômeno mundial. Trata-se de um fenômeno irreversível.
Essa
tendência não pode ser interrompida — e nem muito menos revertida — por políticas
industriais, as quais se resumem a protecionismo e mais gastos governamentais,
tudo com base na espúria noção de que políticos irresponsáveis (e quase sempre
sem experiência na área) sabem melhor como usar e investir os recursos escassos
disponíveis. Tais políticas fracassaram completamente no passado, e fracassarão
de novo no futuro.
Uma
genuína reindustrialização requer simplesmente mais oxigênio para a indústria. Requer
nada menos que a abolição dos obstáculos artificiais que as intervenções governamentais
criaram ao longo das últimas gerações.
Mas,
ainda assim, a indústria jamais voltará a ter a proeminência de antes. E muito
menos os empregos.