quinta-feira, 27 set 2018
Muito se fala sobre o suposto perigo representando
por Jair Bolsonaro, mas é praticamente inexistente na grande imprensa e
televisão qualquer alerta sobre o risco para o país de um eventual governo de Fernando Haddad,
candidato do PT à Presidência.
Se ele for eleito, será o primeiro intelectual
declaradamente marxista a ser presidente do país. Antes dele, o mais próximo
que tivemos foi Fernando Henrique Cardoso, que antes migrou das hostes do
marxismo universitário para uma práxis política social-democrata.
Assim como FHC, Haddad é filho da Universidade de
São Paulo (USP): foi na USP que ele se formou em Direito (1985), fez mestrado
em Economia (1990) e doutorado em Filosofia (1996).
Assim como FHC, se tornou professor da instituição,
mas na área de ciência política. Entrou para o PT em 1983, e em 1985 se elegeu
presidente do centro acadêmico da Faculdade de Direito.
A partir do ano 2000, começou a trabalhar em
governos petistas, primeiro na gestão
de Marta Suplicy na prefeitura de São Paulo e, depois, no governo
Lula. Exerceu cargos no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e no
da Educação até se tornar titular da pasta em 2005.
Em 2012, se elegeu prefeito de São Paulo e fez
uma administração desastrosa. Em 2016, quando estava no último ano de
mandato e tentava a reeleição, o Datafolha divulgou pesquisa (ver link acima)
em que Haddad tinha rejeição de 47%, a pior avaliação entre os prefeitos desde
2000, quando o então prefeito Celso Pitta disputou a reeleição e perdeu no
primeiro turno. Haddad recebeu apenas 16,70% dos votos válidos (perdendo
até para brancos e nulos) e foi derrotado por João Doria.
Formação
Se Lula se orgulhava de seu anti-intelectualismo,
Haddad jamais escondeu seu gosto por ser identificado como intelectual,
professor e político ilustrado.
Em um artigo
para a revista esquerdista Piauí
publicado em 2017, texto esclarecedor de suas posições e métodos, ele declarou
as suas influências e compromisso ideológico:
Meus
anos de universidade foram marcados pelo convívio com a nata da
intelectualidade uspiana. Discutia filosofia com Paulo Arantes e Ruy Fausto,
crítica literária com Roberto Schwarz, economia política com José Luís Fiori,
história com Luiz Felipe de Alencastro, sociologia com Gabriel Cohn, direito
com Dalmo Dallari e Fabio Comparato — e assim por diante. Estamos falando de
grandes intelectuais a quem os jovens professores submetiam nossa produção
acadêmica.
Em uma entrevista
concedida cinco anos antes ao jornal O
Estado de S. Paulo, Haddad revelou outras influências importantes para
entendermos quem ele é e o que pensa:
Do
ponto de vista do pensamento brasileiro, havia uma tradição que dialogava muito
com a perspectiva marxista, que tem o Caio Prado, Fernando Novaes, Fernando
Henrique Cardoso.
Depois,
pensadores que não eram marxistas, mas que dialogavam com a tradição da
esquerda radical, como por exemplo Antonio Candido, Luis Felipe de Alencastro,
Chico de Oliveira, Paulo Arantes.
Todos
esses, marxistas ou não, esquerdistas radicais, por assim dizer, moldaram a
minha formação. Não escreveria essa interpretação do que foi o modelo soviético
[mais sobre isso abaixo] sem a inspiração desses autores.
Evidente
que o Marx é a inspiração longínqua, mais moderna. E não é mais possível falar
em marxismo, são 'marxismos'. Eu me filio à tradição de Frankfurt, que tem no
Adorno e no Marcuse as expressões mais vistosas.
A referência à Escola de Frankfurt é
importante: seus integrantes criaram instrumentos intelectuais para tornar
possível uma revolução cultural e política a partir do controle da linguagem e
das ideias. O corolário desse empreendimento, alicerçado no marxismo, era a
mudança de mentalidade e da própria política formal. Do politicamente correto à
bandidolatria e antirreligiosidade, várias agendas ideológicas que hoje
afetam o mundo ocidental são resultado direto da produção teórica da Escola de
Frankfurt.
Com essas influências, Haddad escreveu os seguintes
livros:
* O sistema
soviético
* Em
defesa do socialismo (nesta entrevista à Revista Época, ele diz: "Eu
sou um socialista")
* Sindicatos,
cooperativas e socialismo
* Trabalho
e linguagem – Para a renovação do socialismo.
Escrito em 1989, ano da queda do Muro de Berlim, o
livro O sistema
soviético é uma tentativa de mostrar que a revolução de 1917 na
Rússia não foi comunista, mas tão somente "anti-imperialista". Os
revolucionários comunistas não conseguiram, segundo ele, criar o socialismo a
partir de um Estado operário. Inauguraram, por outro lado, a fase de transição ao
modo de produção asiático, que poderia ser identificado com o capitalismo de
Estado.
O que Haddad fez nesse livro foi uma crítica aos
erros do sistema soviético não pelo que a ideologia socialista/comunista
representava ou pelo que o regime soviético produziu de infame, mas para tentar
isentar o socialismo como ideia e projeto de toda a desgraça humanitária
cometida no século XX.
Ele pretendia demonstrar teoricamente que o socialismo jamais foi realizado
mesmo na Rússia comunista e na União Soviética. (Ou seja, trata-se da surrada e repetitiva tese
de que o socialismo
falhou porque não foi socialista de verdade).
Por analogia, não seria forçado pensar que a sua
presidência representaria para o PT e para a ideologia que orienta a sua luta
uma correção de rumo que os comunistas não conseguiram realizar a tempo de
evitar a queda da União Soviética. Haddad e seu partido têm hoje uma chance que
os comunistas russos não tiveram ou deixaram escapar com a abertura promovida
por Mikhail Gorbachev.
O que esperar
Uma vez no comando do Poder Executivo federal,
Haddad provavelmente fará o que Lula não tinha condições intelectuais de fazer
e que o seu partido, o PT, não conseguiu realizar por inteiro: controlar o estado
de uma maneira mais profissional e ideológica a partir de seu conhecimento
teórico sobre o socialismo e com base na experiência (erros e acertos) de sua
gestão na prefeitura de São Paulo e nos governos de Lula e Dilma.
Sendo Haddad um intelectual orgânico e político
profissional com experiência no Poder Executivo, evitará cometer os erros de
quando foi prefeito e os do seu partido, que está sedento
por poder e vingança.
O que os governos Lula e Dilma fizeram na
Presidência será pequeno diante do que está por vir numa eventual presidência
de Fernando Haddad, o marxista
frankfurtiano.
Haddad se expressa bem e tem formação teórica, o que
significa que ele consegue se passar por moderado mesmo sem sê-lo; consegue se
passar como alguém preocupado com a democracia, com a justiça social e com a
igualdade, omitindo o que entende por essas expressões e tornando palatável a
agenda radical que está por trás desse projeto.
É, portanto, um político perigoso pela capacidade de
disfarçar aquilo que só se manifestará quando estiver no poder, e mesmo assim
nem tudo será aparente no seu governo.
Em outro trecho daquele artigo para a Piauí, Haddad afirmou ter lido "praticamente todos os clássicos sobre
a formação do Brasil" e que "conhecia teoricamente o nosso país". Escreveu isso
para realçar logo em seguida que "a experiência prática" que vivenciou no
exercício da política era insubstituível. "Vivi na pele o que li nos livros."
Pelo que escreveu, disse e tem dito, e com base na
sua experiência e na do PT, Fernando Haddad é o candidato mais perigoso e que
poderá infligir mais danos irreversíveis ao país caso seja eleito no próximo
dia 7 de outubro.
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Artigo
originalmente publicado no jornal Gazeta
do Povo