Luiz Carlos Bresser-Pereira, cuja mente assombra o
mundo com ideias originalíssimas — como aquela que substituiu um plano (Plano
Cruzado) que se baseava no congelamento de preços, aluguéis e salários por
outro plano (Plano Bresser) que se baseava no congelamento de preços, aluguéis
e salários —, nunca decepciona.
Sempre que
ele faz um comentário sobre economia, a diversão é maior que aquela propiciada
por uma
esquete de Ricky
Gervais.
A mais recente contribuição da invejável mente de Bresser-Pereira para os anais da teoria econômica foi a sua recente postagem
em seu perfil no Facebook. Disse ele:
Confirma-se
que o Brasil está saindo da crise
Enquanto
os economistas ortodoxos ficam tolamente indignados porque o ajuste fiscal
"não é suficiente para tirar o país da crise" e os economistas da
esquerda igualmente ficam também tolamente indignados porque "o ajuste
fiscal está aprofundando a crise", eu tenho insistido que o ajuste
principal o mercado (a lei da oferta e da procura) já fez — o da taxa de
câmbio — e tenho previsto que logo a economia brasileira estará saindo da recessão.
O pessimismo de um lado e de outro é mera incompetência.
Pois
bem, afinal as notícias começam a confirmar minha previsão. O superávit
comercial de 2015 foi "supreendentemente" maior do que se esperava. E
hoje o Valor informa que os bens industrializados voltaram a liderar as
exportações depois de um longo inverno de liderança das commodities. Um dia
ortodoxos e a esquerda conseguirão revogar a lei da oferta e da procura, mas
enquanto isto não acontecer vamos tratar de ver o que acontece com os preços
macroeconômicos, principalmente com o mais estratégico (e mais esquecido porque
mais temido) de todos: a taxa de câmbio. Ela já está além do equilíbrio
competitivo, que estimo ser hoje de cerca de R$ 3,80 por dólar, as as boas
empresas brasileiras voltaram a ser competitivas.
Comecemos pelo básico: Bresser-Pereira recorre ao truque de deixar subentendido que as exportações estão se recuperando e que isso decorre da desvalorização do câmbio. Ambas estão erradas.
Não houve absolutamente nenhuma recuperação das exportações. Ao contrário: as exportações seguem caindo, não
obstante toda a desvalorização cambial (que Bresser-Pereira diz ser o elixir
para o crescimento). O que ocorre é que
as importações caíram ainda mais que
as exportações, daí o "surpreendente superávit comercial de 2015".
Ou seja, a recessão no Brasil está tão forte, e a
queda no poder de compra da população está sendo tão intensa, que o povo
simplesmente não está conseguindo importar como vinha fazendo antes. Ao mesmo tempo, a economia está tão desarrumada
e a incerteza está tão grande, que não está havendo investimentos capazes de
aumentar a produção e impulsionar as exportações.
Apresento a Bresser-Pereira este gráfico do Banco
Central:
Como é possível ver, tanto as exportações quanto as importações desabaram ao
mesmo nível de 2007. Regredimos de 9 anos
na economia.
Em números mais claros, as exportações em 2015 tiveram
uma
queda de 14,1% em relação a 2014, sendo que o câmbio em 2015 foi consistentemente
mais desvalorizado que em 2014.
Já as importações tiveram uma queda
de impressionantes 24,3% em relação a 2014, dando a dimensão de como o
poder de compra da população se esfacelou.
No entanto, segundo Bresser, "o Brasil está saindo
da crise" e "as boas empresas brasileiras voltaram a ser competitivas".
Resta saber em qual dimensão o economista habita.
Como disse
o presidente do IMB, Helio Beltrão:
Bresser
Pereira parece residir em um mundo da fantasia. Enquanto os brasileiros perdem
poder aquisitivo, perdem emprego e perdem seu presente e futuro, Bresser está
feliz pois o dólar subiu.
As
'boas empresas brasileiras' que Bresser diz que se beneficiam estão valendo em
média 25% menos em reais, e menos da metade em moeda forte do que valiam há
pouco mais de um ano. Keynesianos e neodesenvolvimentistas como Bresser
destroem os país com suas ideologias destrutivas, e mesmo em face de todas as
evidências em contrário, seguem em sua defesa.
Na realidade, Bresser-Pereira faz parte daquela escola
desenvolvimentista que nós, do IMB, nunca nos cansamos de denunciar: pessoas
para quem uma taxa de câmbio desvalorizada é o elixir do progresso.
Para essa turma — que tem uma estranha e insaciável
tara com a destruição do poder de compra da moeda —, dizimar o poder de compra
da população é algo bom para a economia.
Segundo tais pessoas, a desvalorização do câmbio —
ou seja, a destruição do poder de compra da moeda — é o segredo para
impulsionar a indústria e o setor exportador brasileiro. Ao se
desvalorizar o câmbio, dizem os gênios, as exportações são estimuladas e,
liderada por um aumento nas exportações, a indústria volta a produzir e, por
conseguinte, toda a economia volta a crescer.
O primeiro grande problema é que, no mundo
globalizado em que vivemos, vários exportadores são também grandes importadores.
Para fabricar, com qualidade, seus bens exportáveis, eles têm de importar máquinas
e matérias-primas de várias partes do mundo. E elas também têm de
comprar, continuamente, peças de reposição.
Se a desvalorização da moeda fizer com que os custos
de produção aumentem — e irão aumentar —, então o exportador não mais terá
nenhuma vantagem competitiva no mercado internacional.
Aliás, não deveria causar nenhuma surpresa o fato de
a própria indústria automobilística ter vindo a público admitir que a
desvalorização cambial — ao contrário do que pregam os economistas
desenvolvimentistas — não apenas
está encarecendo a produção, como também está gerando incertezas para o setor.
Vale lembrar, adicionalmente, que a
desindustrialização no Brasil chegou ao auge justamente no período em que a
moeda mais se desvalorizou. A desindustrialização
está ocorrendo é
justamente agora, quando temos uma moeda fraca, inflação alta, e as maiores tarifas
protecionistas da história do real.
Exatamente ao contrário do que defendem os
economistas desenvolvimentistas, é justamente quando o câmbio está se
apreciando (como ocorreu de 2005 a 2008, e de 2010 a 2011 no Brasil), que a
indústria fica mais forte. E é justamente quando o câmbio se desvaloriza
(2009, e 2012 em diante), que a indústria encolhe. (Veja todos os gráficos aqui).
E o motivo é óbvio, o que nos leva ao segundo ponto:
câmbio desvalorizado significa moeda com menos poder de compra. Moeda com
menos poder de compra significa renda menor para a população e preços em
contínua ascensão (o IPCA de 2015 fechou em 10,67% majoritariamente por causa
da desvalorização cambial defendida por Bresser).
E renda menor em conjunto com preços em contínua
ascensão significa que a demanda por bens de consumo diminui.
E isso afeta todo o setor industrial e atacadista. Afeta toda a cadeia produtiva, que entra em contração
e gera o efeito contrário ao imaginado pelos desenvolvimentistas.
No entanto, para essa turma da qual Bresser faz
parte, uma desvalorização cambial é algo perfeitamente possível de ser isolado
do resto da economia. Não há efeito
colateral nenhum. A desvalorização irá
ajudar a indústria e não prejudicará mais ninguém. Todos ganham.
Quanto mais desvalorizado for o câmbio — ou seja, quanto menor for o
poder de compra da população —, mais rica será a economia. Faz sentido, não? Quanto mais pobre você está, quanto menos você
consegue comprar, mais rico você é.
"Destrua o poder de compra da moeda, e surgirão
uma Apple, uma Microsoft e uma Google", parece ser o lema deles. Desvalorize
o câmbio, e o país vira uma potência industrial.
Enquanto o ideário econômico estiver sendo ditado
por essas pessoas, nossa aspiração será a Venezuela.
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Artigos
que aprofundam as visões aqui expostas:
Uma radiografia da
destruição do real - ou: não há economia forte com uma moeda doente
A nossa "depreflação" e o ajuste fiscal que não virá: a necessidade de um novo Plano Real
Três consequências da
desvalorização da moeda - que muitos economistas se recusam a aceitar
Para impedir a destruição
do real e do setor industrial, o Banco Central tem de ter concorrência
A impiedosa destruição do
real (números atualizados para agosto)